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terça-feira, 27 de agosto de 2024

A FILOSOFIA NA JAULA DE FERRO (XX)

  DRAFT para um capítulo do livro a ser publicado com o título de "Introdução histórica à filosofia".

 

  

  

 

XX

A FILOSOFIA NA JAULA DE FERRO

 

A necessidade da filosofia só pode nascer em épocas de crise, quando o poder de unificação desaparece da vida dos homens, e as oposições, perdendo a sua viva semelhança e reação recíproca, se tornam independentes.

Hegel

 

 

Há quem diga que vivemos uma época de escolasticismo filosófico que dificulta desenvolvimentos disruptivos.[1] Ao que parece, nos últimos anos esse escolasticismo tem sido vítima de uma brutal racionalização e burocratização do trabalho filosófico, que promove interpretações acuradas, desenvolvimentos pontuais e filosofia popular, mas que se arrisca a paralisar a possibilidade de inovações profundas. Segundo alguns isso pode estar acontecendo não só com a filosofia, mas até mesmo com a própria ciência.[2] Nesse último capítulo – assumindo a justeza dessa constatação – quero esforçar-me para trazer algum esclarecimento sobre as raízes das presentes dificuldades, além de mostrar alternativas. Contudo, receio não ter sido capaz de fazer mais do que organizar um pot-pourri de ideias esparsas tomadas de fontes diversas.[3]

 

1

 

Quero começar considerando um fenômeno sociocultural importante e pervasivo no curso do desenvolvimento da civilização, que Max Weber chamou de Entzauberung der Welt: a demagificação do mundo.[4] Embora Weber tenha se concentrado no exame de processos sociais advindos da reforma protestante e do desenvolvimento das economias capitalistas, sua origem foi bem mais remota. No início do processo civilizatório o mundo que nos rodeia era visto como algo vivo, capaz de possuir entendimento e paixão e de responder aos apelos humanos. Como complemento, as práticas culturais que presidiam as comunidades humanas eram elas próprias organicamente construídas com base nas interações sociais do assim chamado mundo da vida (Lebenswelt) – o mundo do agir quotidiano. Assim era o mundo que pode ser descrito como “mágico”. Mesmo após a emergência do monoteísmo judaico-cristão, quando as comunidades eram administradas em associação com lideranças religiosas, quando ainda existiam santos e milagres, quando a vida humana ainda era controlada pela religião, o universo humano era repleto de magia.

   Contudo, especialmente com o desenvolvimento da economia capitalista no final do século XIX e com o desenvolvimento da ciência e tecnologia que a acompanhou, produziu-se um rompimento muito mais profundo com a visão religiosa antes existente. Ainda que as religiões permaneçam influentes, elas hoje muito mais acompanham do que presidem a vida humana. O que vemos é a gradual e hoje acelerada substituição do mundo animista por um mundo cada vez mais secular, cada vez mais “mundanizado”. O desenvolvimento da ciência e da técnica faz com que a magia e a força institucional do mundo místico percam seu poder. O que ao nível da organização social promove essa substituição é a introdução do que Weber chamou de processos de racionalização e burocratização da sociedade, que tornam a produção de bens muito mais eficaz, mas que se instalam muitas vezes em detrimento da ação valorativa. Sob essas condições a alienação é inevitável: o indivíduo passa a ser uma peça em um mecanismo que ele mesmo desconhece, ao mesmo tempo em que perde seu enraizamento naturalmente construído no mundo da vida. Isso produz um aumento do individualismo acompanhado de um empobrecimento alienador de sua subjetividade reflexiva.

   Hoje, quando a ciência e a técnica conquistam cada vez mais a vida humana, vivemos sob a égide dessa forma de demagificação. Como Jürgen Habermas tentou sumarizar: a patologia do mundo contemporâneo consiste na “colonização do mundo da vida pelo sistema” (entendendo-se por sistema as instituições de poder econômico e político).[5] Uma razão para ser assim poderia ser que os sistemas são “autopoiéticos” no sentido de que uma vez estabelecidos, eles se organizam e desenvolvem de modo autônomo, ao menos enquanto deixados à revelia de um controle social suficientemente crítico no sentido de assegurar que eles permanecem vantajosos para a sociedade que os criou. Mas essa não parece ser a única razão.

   Weber introduziu o conceito de demagificação sob a influência de Nietzsche, o que nos faz pensar na questão do niilismo. Como vimos, uma consequência da perda do papel fundacional da crença religiosa na sociedade pode ser o niilismo, que tanto pode levar à perda dos valores morais quanto a ideologias simplificadoras, como no caso de seitas místicas degeneradas ou de sistemas totalitários, a exemplo do comunismo marxista-leninista em sua versão estalinista ou do nazifascismo. Trata-se nos dois últimos casos de patologias sociais profundamente perturbadoras, que sob outros nomes ainda hoje nos assediam.

   Embora Weber admitisse a inestimável importância social da racionalização e da burocratização na melhoria do desempenho da sociedade como um todo, ele também foi um crítico enérgico de suas limitações e do risco de comportarem efeitos colaterais socialmente e culturalmente patológicos. Vale citar aqui a famosa passagem em que ele usou a metáfora da jaula de ferro para expor a perda da autenticidade da vida interior em um mundo cientificamente racionalizado e burocratizado:

 

Ninguém sabe quem irá viver nessa jaula no futuro, ou se no final desse tremendo desenvolvimento profetas inteiramente novos surgirão, ou se haverá um grande renascimento de velhas ideias e ideais, ou, se nada disso, petrificação mecanizada, embelezada por uma espécie convulsiva de auto importância. Para o “último homem” desse desenvolvimento cultural pode ser bem verdadeiramente dito: “Especialista sem espírito, sensualista sem coração; essa nulidade imagina que conquistou um nível de humanidade nunca antes alcançado”.[6]

 

O moderno sistema econômico-institucional voltado para os fins (Zwecksorientiert) desfaz os modos de apreensão e domínio da realidade míticos, nascidos e elaborados organicamente a partir de formas de vida sociais passadas, substituindo-os por um sistema frequentemente alienador, que se apresenta na forma de instituições burocráticas que modelam ideologicamente os interesses dos seres humanos a elas pertencentes. Quando o efeito dessas instituições se torna verdadeiramente alienador, os seres humanos passam cada vez mais a funcionar como pequenas peças cuja única ambição é a de se tornarem peças maiores no interior de um imenso maquinismo dentro do qual, sem perceber, trilham um caminho que só poderá conduzi-los, segundo Weber, à “noite polar da mais gélida escuridão”[7]. Esse diagnóstico só não é mais pessimista porque, como notei, ele acreditava que a sociedade que produz as jaulas de ferro tem poder suficiente para corrigir e transformar as instituições por ela criadas.

   Meu ponto é que a racionalização e burocratização da sociedade ajudam-nos a explicar as deficiências da filosofia em seu momento atual. Trata-se de apontar para o principal problema da filosofia contemporânea, que já foi denunciado por filósofos como Wittgenstein, P. F. Strawson, Susan Haack e até mesmo Martin Heidegger: o cientismo.

 

2

 

Os processos de burocratização e racionalização encontram-se ligados a outro elemento ideológico que parece indispensável ao esclarecimento da problemática aqui abordada. Trata-se do fenômeno de massificação da cultura que atende pelo nome de indústria cultural,[8] o qual deve se encontrar intrinsecamente associado o processo de burocratização/racionalização da sociedade. A alta cultura do passado de nada serve à ideologia da sociedade tecnológica na qual vivemos, cada vez mais materialista e hedonista. A cultura de massa suspende o elemento de conflito que surge quando precisamos opor uma vida dominada pela ação voltada para a consecução de fins materiais à ação valorativa. Isso significa que a arte deve ser rebaixada de seu potencial crítico e que a religião, ou qualquer sublimação de sentimentos, deve ser tornada suficientemente banal para limitar seu potencial de formação de conteúdos críticos paralisadores da ação e perturbadores da ordem social. A ideia é que nos dias de hoje o ser humano se encontra em geral tão profundamente mergulhado na cultura de massa produzida pela assim chamada indústria cultural, que se tornou inteiramente incapaz de se aperceber de seu grau de alienação.

   Mais do que isso, a indústria cultural tem invadido a própria instituição universitária, o que se faz sentir principalmente na prática filosófica. A universidade, quase o único refúgio da filosofia nos últimos 100 anos, passou a coibir seu desenvolvimento na forma de uma cultura superior. E as razões atendem por nomes como demagificação, burocratização, racionalização, colonização do mundo da vida pelo sistema e agora também pela sua subserviência à indústria cultural na forma de uma reflexão filosófica academicamente massificada.

   A questão mais profunda é a seguinte. A sociedade tem o poder de questionar e neutralizar o processo de burocratização democrática quando ele se demonstra massificador da cultura, como Jürgen Habermas demonstrou, através do discurso dialógico (Diskurs) em situações ideais de fala nas quais os interlocutores são identicamente preparados e informados, só sendo pressionados pelo melhor argumento.[9] Mas então, por que não o faz? Creio que parte da resposta possa ser encontrada em Freud.[10] Para ele o ser humano é por natureza inimigo da cultura. A civilização – incluindo-se nela a alta cultura da qual faz parte a filosofia estudada nesse livro – é para o ser humano como uma arma de dois gumes: se de um lado facilita a vida, de outro demanda repressão pulsional, oprimindo o indivíduo. Na modernidade europeia (de Descartes a Kant) havia espaço para a alta cultura na música, na literatura e na filosofia, em função mesmo das exigências restritivas que a civilização europeia, colonialista, demandava. Tensões semelhantes devem ter ocorrido no Renascimento e na Grécia Antiga. Note-se, por exemplo, que no tempo de Bach uma cidade alemã com cinquenta mil habitantes podia ter meia dúzia de salas de concerto. A Königsberg de Kant tinha cerca de 65 mil habitantes, tanto quanto a cidade de Caicó no Rio Grande do Norte. A revolução industrial deve ter diminuído muito a pressão repressiva necessária à sustentação da alta cultura – um fenômeno já reclamado por Nietzsche. E nosso mundo tecnológico permite um alívio da pressão repressiva compatível com um modus vivendi cada vez mais hedonista. Essa seria uma razão profunda da rejeição que a alta cultura tem hoje sofrido. O ser humano não precisa mais dela. Bach, Goethe e Leibniz se tornaram supérfluos.

   Muitos dirão que essa explicação freudiana é insuficiente por ignorar o papel da superestrutura ideológica. Filósofos influenciados por Marx, como Theodor Adorno, Max Horkheimer e Herbert Marcuse, culparam o capitalismo pós-industrial pela alienação cultural do homem contemporâneo, vítima da indústria cultural. Marcuse, unindo Freud a Marx, introduziu o conceito de dessublimação repressiva: impulsos e desejos só podem ser satisfeitos se não forem tão elevados a ponto de ameaçar as estruturas de poder e ação existentes. A superestrutura ideológica imposta pelo capitalismo avançado alimenta o filistinismo cultural capaz de tornar as pessoas mais úteis para a produção tecnológica e para o consumo de seus produtos, em um círculo vicioso de trabalho e consumo a lembrar a estória do asno que puxava a carroça na tentativa de comer a cenoura pendurada à frente de seu focinho. A prática filosófica real, podemos sugerir, não escapa às vicissitudes impostas pela dessublimação repressiva. Ela serviu no passado e continua servindo ainda hoje à superestrutura ideológica, apesar de Marx, Nietzsche e Wittgenstein.

 

3

 

Para melhor compreendermos os mecanismos envolvidos na produção da reflexão filosófica precisamos considerar três peculiaridades da prática filosófica que a tornam intrinsecamente ligadas à forma de vida.

   A primeira é que, a partir de uma perspectiva freudiana o pensamento filosófico resulta do que Freud chamava de processo primário (Primärvorgang). Como já vimos no capítulo XVI (sec. 1), nesse processo, que é comum tanto ao sonho quanto à arte, às manifestações religiosas e à produção filosófica, as cargas afetivas (Besetzungen) não se encontram firmemente ligadas às representações que lhe são próprias, como acontece com o pensamento científico, que serve ao princípio da realidade (Realitätsprinzip). O processo primário está a serviço do princípio do prazer (Lustprinzip), que para Freud falha em distinguir suficientemente o imaginário do real. Isso significa que a filosofia também pertence ao mundo mágico, um pouco como a arte e a religião. Como consequência disso, tanto quanto a arte e a religião, ela corre o risco de ser estranhada como não só inútil, mas também contraprodutiva frente aos mecanismos de racionalização pertencentes a um processo de demagificação que parece ter se tornado desperdiçadamente apressado.

   A segunda peculiaridade, que já considerei no capítulo inicial desse livro (sec. 9), diz respeito à visão da filosofia como uma prática cultural derivada, a exemplo da ópera, que se constitui de uma combinação de canto, poesia e enredo. Já a filosofia resulta de material, motivação e procedimentos derivados de três práticas culturais fundamentais, que são a religião, a arte e a ciência. Ela deve ser constituída de três componentes: o de derivação mística, que chamei de totalizante ou holístico, responsável pela profundidade e abrangência da visão filosófica, o componente estético, que se mostra na forma de sua expressão inevitavelmente metafórica, e o componente heurístico, que deve responder pelos procedimentos argumentativos orientados pela busca da verdade. Nas elaborações que Platão fez de sua doutrina das ideias, por exemplo, vemos um componente de elucidação mística compreensiva derivado de seu orfismo, um componente estético, evidenciado no recurso inevitável a metáforas e nas extraordinárias alegorias que compõem seus diálogos, eles mesmos obras de arte, e ainda um componente heurístico (protocientífico), de busca da verdade, que é visto, por exemplo, em sua tentativa de explicar como é possível dizer o mesmo de muitos ou em sua tentativa de definir o conhecimento como a opinião verdadeira completada por um logos. Filósofos como Hegel, Nietzsche e Locke, estavam respectivamente inclinados aos extremos da religião, da arte e da ciência, embora inevitavelmente preservassem algo das outras duas dimensões, uma vez que alguma conjunção dos três pareça imprescindível para de algum modo qualificar a filosofia enquanto tal. Mesmo tradições filosóficas inteiras, como também fiz notar, a alemã, a francesa e a anglo-americana, deixam-se perceber como respectivamente inclinadas aos extremos místico, artístico e científico.

   A terceira peculiaridade diz respeito à direção. A filosofia pode ser facilmente vista como uma protociência quando consideramos que todas as ciências particulares nasceram dela. Nesse sentido a filosofia é o que pode ser feito antes que sejam encontradas as condições para a investigação verdadeiramente científica, servindo ao menos para motivar a indagação. Ela é o berçário das ciências, ocupando o lugar no qual podeá caber alguma ciência futura, conquanto se entenda a palavra ‘ciência’ de um modo suficientemente liberal e flexível, como qualquer espécie de “conhecimento público consensualizável” (John Ziman) (ver cap. I, sec. 8).

   Considerando essas três peculiaridades da filosofia chegamos a uma inevitável conclusão: como ela é um produto do processo primário, como ela resulta de motivações de cunho místico-totalizante e de inevitáveis elementos estéticos, e como ela não pode se tornar ciência sem deixar de ser filosófica, ela se encontra sempre e inevitavelmente infundida de magia e enraizada no mundo da vida.

   Tendo as considerações acima em vista torna-se claro que na era da informação, em uma sociedade como a nossa, aceleradamente racionalizada e burocratizada em favor da ciência aplicada e da técnica, tanto o impulso de abrangência místico quanto o estético devem ser submetidos a um processo de domesticação, quando não de anatematização. Afinal, a religião e a arte pertencem antes ao mundo mágico e, consequentemente, também à filosofia, na medida em que esta última precisa ser, em alguma medida, constituída e impulsionada por motivações totalizantes e estéticas. Ora, se excluirmos ou pelo menos dessublimarmos os componentes totalizantes e estéticos da filosofia, de modo a restarem apenas os procedimentos heurísticos, considerando que os últimos deveriam encontrar-se aqui inevitavelmente permeados pelos primeiros, o resultado inevitável é algo como o cientismo. Em vez de aproximações heurísticas feitas através do processo primário (ex.: os “átomos” de Demócrito), procura-se geralmente no mais das vezes fantasiar de modo reducionista uma filosofia científica, como se a filosofia pudesse resultar de processos secundários.

   O maior preço pago pelo cientismo é o reducionismo puro e simples, que consiste na exclusão de uma ou mais dimensões da investigação puramente filosófica. Pense, por exemplo, na inacreditável definição da filosofia como a lógica da ciência por Rudolph Carnap, excluindo todo o resto, ou na tese de Quine da indeterminação da referência, que deveria eliminar teorias da referência minimamente robustas da filosofia da linguagem, ou ainda na tentativa de Alvin Goldman de substituir a epistemologia tradicional por uma ciência cognitiva.[11]

   Note-se que não estou com isso rejeitando o reducionismo in totum. Há extraordinárias pérolas de criatividade soltas por aí. Saul Kripke desenvolveu uma teoria da referência que foi reducionista com relação ao elemento cognitivista da linguagem, mas seu trabalho foi de extrema importância.[12] Mesmo um cientificista radical como W. V-O. Quine trouxe contribuições de interesse.[13] A crítica metafilosófica é, nesse sentido, construtiva; ela não veio para devastar a filosofia.

 

4

 

Desejo agora a examinar algumas maneiras pelas quais os atuais mecanismos de racionalização burocrática são capazes de militar contra o que de melhor pode ser feito em filosofia.

   Considere primeiro, por razões comparativas, o modo como a filosofia foi feita nos tempos de Locke e Hume, na Grã-Bretanha, ou nos tempos de Kant e Hegel, na Alemanha. Ela sempre foi, da parte do filósofo, o resultado de um longo, persistente e imenso “trabalho sobre si mesmo... sobre o próprio modo de ver as coisas”, para usar as palavras de Wittgenstein.[14] Naqueles tempos, a filosofia era honrada por uma nobreza erudita e por uma classe letrada que valorizava a alta cultura em uma sociedade que era (para o bem e para o mal) extremamente estratificada. Foi assim até a primeira metade do século XX. Nesse meio elitista no melhor dos sentidos a publicação poderia esperar. Nas revistas especializadas sobrava espaço para a publicação de artigos. Gilbert Ryle, um filósofo renomado, era editor da revista Mind. Foi assim até pelo menos a Segunda Guerra Mundial. Um princípio ético seguido por pessoas como J. L. Austin era o de só publicar no caso de se ter algo importante a dizer. Em outras palavras, a filosofia era obra de uma pequena casta de intelectuais com a liberdade de fazer o que quisessem, enquanto quisessem, se bem o quisessem. A velha premissa grega do “ócio criativo”, imprescindível à especulação descompromissada, ainda estava sendo cumprida.

   Algum esclarecimento pode ser encontrado quando comparamos a situação atual com momentos de explosão cultural no passado. A verdadeira inovação, cultural e científica, é sempre subversiva. Ela demanda um profundo e inevitável redimensionamento de valores. Por isso a alta cultura só encontra solo fértil para crescer onde existem grandes conflitos capazes de forçar o desenvolvimento e a assimilação de grandes rupturas, lembrando a citação de Hegel no início desse capítulo. Isso aconteceu na primeira metade do século XX. Era imenso o sentimento de tensão e insegurança nos relatos dos que viveram aquela época. As velhas instituições, como a monarquia, estavam em ruinas e os conflitos sociais acumulados acabariam por resultar na Segunda Guerra Mundial. Não se sabia o rumo seguir. Desse caos, resultante de uma desconfiança generalizada dos valores, ideias e instituições tradicionais, resultou uma renovação cultural que em suas dimensões lembra o que aconteceu durante o Renascimento. Surgiram artistas renovadores como Picasso e Dali na pintura, James Joyce na literatura, Igor Strawinsky e Béla Bartók na música, e ainda filósofos de profunda originalidade como Wittgenstein e Russell – que recuperaram Frege – ou mesmo Edmund Husserl e um analista da psicologia e da cultura revolucionário como Sigmund Freud. E junto a isso veio a grande revolução da física moderna, com a criação da teoria da relatividade por Einstein e o aparecimento da teoria quântica através do esforço conjunto de alguns físicos excepcionais. Foi assim até o fim da Segunda Guerra Mundial, quando o mundo voltou à normalidade. A filosofia foi então absorvida por um cada vez mais amplo sistema universitário, dentro do qual o terreno fértil para inovações disruptivas foi cada vez mais cedendo lugar a uma normalidade que de início, ao menos, foi filosoficamente muito produtiva, ainda que em ponto menor. Talvez não seja surpreendente o fato de que os dois mais significativos filósofos alemães da segunda metade do século XX, Jürgen Habermas e Ernst Tugendhat, tenham nascido na primeira metade do século XX.

   Faço aqui um aparte para notar a curiosa importância de uma autenticamente meritocrática hierarquia acadêmica na produção do conhecimento. As universidades de língua alemã já foram as melhores do mundo. A universidade de Viena foi na década de 20 do século XX o grande centro de produção intelectual da Europa continental. Paris pode ter sido a capital da arte, mas Viena foi a capital da cultura. Contudo, a ascensão do nazismo mudou tudo isso. Os melhores pesquisadores, geralmente judeus, tiveram de exilar-se e foram substituídos por pesquisadores menos capazes. Curiosamente, depois da Segunda Grande Guerra os membros da Universidade de Viena preferiram não os convidar a retornar, uma vez que seriam por eles outra vez eclipsados. O resultado é que a Universidade de Viena nunca mais se recuperou. Algo semelhante pode ser dito das universidades alemãs. Nunca mais voltaram ao patamar inicial. O exemplo pode servir de admoestação para nós mesmos na época presente. Hierarquias intelectuais podem ser facilmente destruídas; reconstruí-las pode ser uma tarefa muito mais árdua. Por isso mesmo, quando uma já esgotada hierarquia do saber é substituída por uma simples hierarquia do poder, o resultado é decadência.

   Susan Haack notou algumas mudanças curiosas nas demandas intelectuais a partir da segunda metade do século XX. Na primeira metade, notou ela, sobrava espaço nas grandes revistas para a publicação de artigos. Mas na segunda metade o número de artigos a serem publicados passou a aumentar para além de uma expectativa de avaliação razoável e a ética pragmática de publicar ou perecer começou a se universalizar. Em meio a pressões sociais e à crescente concorrência, pesquisadores acadêmicos começaram a se transformar de uma maneira que lembra a analogia de Weber, em pequenas peças na engrenagem, cuja única ambição é a de se tornarem peças um pouco maiores. Agora, desde o início do século XXI, com o advento da Internet, o número de artigos acadêmicos cresceu tão exponencialmente, que sua avaliação e possível influência passou a depender muito mais da reputação das instituições e das revistas que os publicam do que de seus valores intrínsecos. Haack, que estudou o problema, acrescenta a isso sintomas de corrupção intelectual como o carreirismo e o compadrio, junto com o que ela chamou de incentivos perversos, como, em filosofia, a doação de bolsas e premiações dentro de um escopo suficientemente restrito e previsível.[15] Por exemplo: as universidades modernas são agora cada vez mais geridas por CEOs que enfatizam a produtividade e a necessidade de que todos sejam ativos na pesquisa. Um conselho para o sucesso, por ela entreouvida, seria “publicar em maior quantidade possível e o mais rápido possível...” Uma tal competição selvagem pode talvez funcionar em alguns domínios da ciência aplicada. Mas é contraprodutiva em filosofia, já que impossibilita a aquisição de uma cultura mais ampla e mais diversificada, além do lento amadurecimento de ideias necessário a um trabalho filosófico original. Aqui a “habilidade computacional” do operário acadêmico toma o lugar da amplitude e profundidade do pensamento, uma vez que só a primeira admite formas de mensuração cada vez mais técnicas e mecânicas.[16] Afora isso, o autor de um artigo filosófico deve adequar seus objetivos às metas pré-estabelecidas por cada vez mais obscuros editores de revistas especializadas, desestimulando a verdadeira originalidade. (Por que razão uma pessoa com o intelecto de Ryle se dignaria hoje a ser editor de Mind?) Afinal, originalidade não pode ser planejada. E obras filosóficas profundamente originais não são esperadas. Elas devem criar seus próprios parâmetros de avaliação ao invés de orientar-se pelos pré-existentes. Todas essas são exigências paralisadoras, senão corruptoras em relação à natureza própria da atividade filosófica. Onde todos devem ser filósofos, ninguém pode ser filósofo. E a filosofia analítica anglo-americana, que por tempo suficiente foi a cabeça do animal, transformou-se hoje em um peru sem cabeça a rodar em torno de si mesmo.

   É aqui que o cientificismo filosófico demonstra seu poder de sedução. Embora tecnicamente exigente, ele não é filosoficamente exigente, o que atrai um número muito maior de pesquisadores: o especialista precisa conhecer apenas algum nicho de discussão dentro do qual está vivendo, junto a alguns dispositivos metodológicos e alguma ciência particular. Ou seja: o filósofo-especialista não precisa adquirir cultura geral, nem aprender história da filosofia e nem mesmo a história recente de seu domínio de investigação. Pessoalmente acho que isso pode ser produtivo em certos domínios periféricos da filosofia e mesmo servir de motivação para o cientista. Haack é mais pessimista. Ela considera esse estado de coisas desastroso.[17]

   Uma outra questão é saber se a academia ainda tem como selecionar pessoas adequadamente vocacionadas. Filosofia, assim como a matemática ou a música, demanda vocação. Após ter estudado a filosofia de Tomás de Aquino, Sir Anthony Kenny definiu a seguinte característica como sendo própria da vocação filosófica:

 

A filosofia é tão abrangente em seu assunto, tão ampla em seu campo de operação, que a obtenção de uma visão filosófica sistemática do conhecimento humano é algo tão difícil que apenas o gênio pode fazê-lo. Tão vasta é a filosofia que apenas uma mente totalmente excepcional pode ver as consequências até mesmo do mais simples argumento ou conclusão filosófica. Para todos nós que não somos gênios, a única maneira de lidar com a filosofia é alcançando a mente de algum grande filósofo do passado.[18]

 

Embora a palavra ‘gênio’ se preste à mistificação, como se fosse algo milagroso, ela pode ser bem entendida como o uso reflexivo e contínuo de um talento no esforço de selecionar entre muitas más ideias aquelas que são boas, em suas relações com um domínio mais amplo do saber, em um processo longo, independente e geralmente inconsciente. Essa foi uma característica distintiva de todos os grandes filósofos discutidos nesse livro, diferente daquilo que é incentivado no âmbito de uma hiperespecialização reducionista e fragmentadora do domínio especulativo.

 

5

 

Uma consequência do que vimos acima, particularmente evidente em domínios centrais da filosofia (incluindo metafísica, epistemologia e filosofia da linguagem) tem sido a fragmentação. Geralmente ela é causada pelo advento de inovações científicas, formais ou não, às quais os filósofos tentam acomodar as problemáticas filosóficas já existentes sem conseguir resolvê-las, multiplicando as alternativas e com isso a discussão.

   Um problema mais sério, mas que no fundo depende do primeiro, é o que Haack chamou de especialização precoce. O mecanismo é o seguinte: adotando alguns pressupostos prima facie questionáveis, teoristas desenvolvem alguma improvável hipótese engraçada com base neles. Essa hipótese engraçada é suspeita e certamente não irá levar a lugar algum. Mas isso pouco importa, pois ela possibilita a todos os participantes da seita entreterem discussões por alguns anos. Finalmente, escreve ela, o tédio se instala e os participantes abandonam o problema, procurando outra hipótese engraçada com a qual possam começar o jogo novamente.[19] A situação agrava-se ainda mais quando estes novos “campos” de especialização começam a subdividir-se em outros, sem um limite em vista.[20] O grande contraste com a discussão sustentada em um verdadeiramente novo campo de especialização científica é que esse último é bem fundamentado, permitindo desenvolvimentos internos seguros, enquanto a especialização filosófica é feita sobre bases hipotéticas instáveis e incertas, que exigem elas próprias serem sujeitas a um sério trabalho de questionamento, o que nunca é feito. Haack nota que quando se trata dos diferentes grupos de teóricos que trabalham na mesma problemática, cada grupo se orientando segundo suas próprias hipóteses engraçadas, esses grupos evitam discutir entre si. Isso não deveria surpreender. Afinal, não se pode tentar avaliar uma improbabilidade através de outra. Como resultado eles formam o que Haack chamou de “panelinhas, nichos, cartéis e feudos”.[21]

   O exemplo que eu escolho são as discussões entre os teóricos da referência na filosofia da linguagem atual, onde um grupo defende teorias metalinguísticas, outro predicativismos, outro semânticas bidimensionais, outro referencialismos, neodescritivismos, etc. Todos esses modismos teóricos fragmentadores devem estar no mínimo mal direcionados se admitirmos ser possível construir alguma teoria abrangente capaz de resolver os problemas de uma vez por todas. No entanto, tentar fazer algo nessa direção e com tais dimensões seria embarcar em uma aventura difícil, perigosa e por seu caráter potencialmente destrutivo oposta a qualquer grupo de interesse – algo a que ninguém que pertença ao meio se submeterá em sã consciência. No entanto, é precisamente esse tipo de aventura que parece capaz de tornar possível o progresso filosófico.[22]

   A conclusão é que em seus domínios centrais, a filosofia contemporânea se encontra estagnada. E a principal razão disso é que a atual racionalização burocrática do sistema universitário tem sido incapaz de lidar com algo essencial à filosofia, a saber, sua inevitável derivação das práticas culturais tanto estéticas quanto místicas, que foram empobrecidas por um processo de massificação que inevitavelmente se estende à filosofia, tanto em seu componente de amplitude e profundidade quanto em seu componente metafórico. Os componentes de abrangência especulativa e carga metafórica (“místico-estéticos”), indispensáveis à filosofia, sua natureza como produto do processo primário, não se prestam a ser substituídos por formas de fragmentação positivistas capazes de ser julgadas por modelos racionalizados de avaliação pragmática de sua prática, a partir de resultados que pareçam avançar o domínio científico e técnico sobre a realidade. O resultado final desse processo é a imobilidade típica do escolasticismo. Se esse estado de coisas continuar, a filosofia, como observou Haack, acabará investigando quantos filósofos são capazes de dançar sobre a ponta de uma agulha.

   Haack não considerou o que chamei de “filosofia popular”: filósofos que vieram de fora do sistema anglo-americano, resistindo à fragmentação. Esse é o caso, digamos, de Slavov Zizek, Markus Gabriel e Quentin Meillassoux. O primeiro, inspirado pelo que aprendeu com Hegel, Marx e Jacques Lacan, tem promovido uma crítica social imaginativa e útil, mas que no aspecto teórico torna-se “lacaniana” no sentido de não ser capaz de produzir mais que expressivas confusões conceituais. O segundo faz apelo a uma multiplicidade de textos históricos e contemporâneos, remasterizando ideias de maneira a satisfazer os anseios de um público juvenil. E o último produz elegantes fantasias intelectuais, no fundo continuadoras do pós-modernismo. A originalidade só é explosiva se combinada com relevância, o que aqui está faltando. A única maneira de salvar a filosofia de sua atual indigência encontra-se na renovação consciente dos pressupostos sobre os quais ela tem se escorado. Por enquanto cresce a suspeita de que a superficialidade aparece como a marca indelével de uma filosofia acadêmica massificada, o que acontece por efeito de uma burocratização que a mercantiliza a serviço da alienação própria de um mundo dominado pela técnica e pela racionalidade instrumental do capitalismo avançado.

 

6

 

Existe uma saída para essas atribulações? Também aqui Haack apresentou o que acredito ser a resposta certa, tomando como modelo o gênio filosófico de C. S. Peirce. O que está faltando é uma filosofia mais propriamente abrangente, o que também equivale a dizer, mais profunda. Wittgenstein escreveu sobre a necessidade de abrangência através de representações panorâmicas ou sinópticas (übersichtliche Dartellugen) de nossa gramática conceitual.[23] Ernst Tugendhat definiu a filosofia como a investigação das estruturas conceituais centrais responsáveis por nossa compreensão do mundo.[24]

   À abrangência Haack acrescenta um elemento heurístico que ela chamou de “busca por aproximações sucessivas”[25] a partir de uma vaga e abrangente concepção inicial. Podemos comparar esse procedimento com a arte de pintar: começa-se com a concepção como um todo, uma vaga exibição de formas, cores, luzes e sombras... Gradualmente as formas são delineadas com mais precisão, erros são detectados e corrigidos, detalhes e tonalidades são adicionados e aquilo que a princípio parecia um borrão incompreensível acaba sendo transformado em imagens claras e convincentes. Podem ser pinturas a óleo, colagens, afrescos... A obra de Habermas, por exemplo, pode ser comparada a uma série de grandes painéis com alguns momentos de grande densidade, como o de sua pragmática universal.

   Para justificar esse método Haack recorreu à noção de consiliência, já explicado no primeiro capítulo (sec. 8). A consiliência é o pressuposto heurístico, indispensável ao progresso da ciência, de que o mundo possui unidade. Se o mundo possui unidade, então as ideias científicas verdadeiras devem se complementar, sendo capazes de se reforçar umas às outras em sua relação com a verdade. A novidade de Haack foi ter aplicado a ideia de consiliência às teorias filosóficas. Wittgenstein percebeu isso recorrendo a uma hipérbole: a dificuldade da filosofia consiste em que, para um problema filosófico ser resolvido todos os outros problemas filosóficos também precisam ser resolvidos. De fato, na medida em que diferentes subáreas da filosofia se encontram interligadas entre si, as teorias desenvolvidas nessas subáreas precisam ser capazes de se reforçar heuristicamente. Isso significa que o filósofo deve adquirir primeiro suficiente cultura científica, humanista e filosófica. A própria ciência pode ser chamada para ajudar em alguns casos, mas não para substituir. E a assunção da consiliência também aqui demanda o procedimento por aproximações sucessivas, tornando os diferentes espaços gradualmente mais coerentes entre si em um grande painel coletivo.

   É óbvio que não podemos fazer isso da mesma maneira que Kant e Hegel. Nem podemos fazer isso sem reconsiderar em profundidade o que os filósofos tradicionais e alguns contemporâneos pensaram. Mas parece perfeitamente possível fazer isso ainda hoje, sobre bases culturais muito mais amplas, no interior dos muito mais estritos e rigorosos espaços de investigação de que dispomos.[26]  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] D. W. Hamlyn: Uma história da filosofia ocidental (Rio de Janeiro: Zahar 1990), p. 398. Isso foi escrito em 1987.

[2] A racionalização e burocratização também podem estar atingindo a própria pesquisa científica de base. Ver, por exemplo, as entrevistas com Gregory Chaitin e Fred Hoyle. A rejeição da vida acadêmica por um matemático de gênio como Gregory Perelman pode não ter sido sem razão.

[3] Seria fácil objetar contra essa estratégia, sob a desculpa de que a coerência de ideias tomadas de fontes muito diversas é questionável. Mas isso é purismo academicista. Nada indica que ideias que não são prima facie contraditórias não possam ser adicionadas de modo a ajudar-nos a compreender mudanças sociais complexas.

[4] Geralmente o termo é traduzido de forma menos literal como ‘desencantamento do mundo’. Ver Max Weber: “Ciência como vocação“, in Ensaios de sociologia (Rio de Janeiro: LTC 1982). PP. 97-107.

[5] Habermas (1986). „Entgegnung.“ A. Honnett, Joas H. (1986) Kommunikatives Handeln Frankfurt/M.: Suhrkamp, pp. 327-417.

[6] Max Weber: A ética protestante e o espírito do capitalismo. Trad. in coleção Os Pensadores n. 37 (São Paulo: Abril Cultural) p. 236.

[7] Max Weber. Political Writings. Ed. Peter Lassman (Cambridge: Cambridge University Press 1994), xvi.

[8]  Cf. Theodor Adorno e Max Horkheimer: Dialética do iluminismo (Rio de Janeiro: Zahar 1985), pp. 99-138. Ver também Herbert Marcuse: O homem unidimensional: Estudo da ideologia da sociedade industrial avançada (Edipro 2015).

 

[9] Na situação ideal de fala a atividade voltada para os fins é avaliada sem coerções externas ou internas, com acesso irrestrito à informação e plena intenção heurística da parte dos falantes. Cf. Jürgen Habermas: “Was heisst Universalpragmatik?” In Karl-Otto Apel Sprachpragmatik und Philosophie (Frankfurt: Suhrkamp 1982)

[10] Sigmund Freud: Mal-estar na civilização (Penguin-Companhia das Letras 2011).

[11] Todos os três exemplos de cientismo foram apresentados por Susan Haack.

[12] Saul Kripke: Naming and Necessity (Harvard: Harvard University Press 1980). Também de Kripke ver: Reference and Existence: The John Locke Lectures (Oxford: Oxford University Press 2018).

[13] W. V-O. Quine: Word and Object (Martino Fine Books 2013).

[14] Culture and Value (Oxford: Blackwell 1996), p. 18.

[15] “Scientistic philosophy, No; scientific philosophy, Yes.” Philosophical Investigations, vol. 15, 2021, pp. 4-35, 26.

[16] Isso não acontece só na filosofia. Há muitos anos ouvi de um sociólogo norte-americano a queixa de que não é mais possível produzir um Max Weber, uma vez que não dispomos do tempo e da liberdade quase ilimitada na aquisição de conhecimento que eram dadas aos professores da universidade alemã do início do século XX.

[17] Susan Haack, “The Fragmentation of Philosophy, The Road to Reintegration,” in Reintegrating Philosophy. Ed. J. F. Göhner, Eva-Maria Junger (Springer Verlag 2016), p. 5.

[18] Anthony Kenny, Aquinas on Mind (London: Routledge 1994), p. 9.

[19] Susan Haack, “The Fragmentation of Philosophy, The Road to Reintegration,” ibid., p. 24.

[20] Cf. Scott Soames. Philosophical Analysis in the Twentieth Century (Princeton: Princeton University Press 2003) vol. II, epílogo. Em oposição a Haack Soames viu essa multiplicação de sub-especializações de forma positiva como a marca da filosofia atual.

[21] Susan Haack, “Scientistic philosophy, No; scientific philosophy, Yes”. Philosophical Investigations, vol. 15, 2021, pp. 4-35, 24.

[22] Para dizer a verdade creio ter feito exatamente isso em um livro que dependeu de anos de pesquisa chamado How do Proper Names Really Work? (Berlim: De Gruyter 2023).

[23] Wittgenstein, Philosophische Untersuchungen (Oxford: Blackwell 2009), I, sec. 122.

[24] Tugendhat, Ernst (1990). „Die Philosophie unter dem Sprachanalytischen Sicht“, in Philosophische Aufätze 1967-1990.

[25] Susan Haack, “Scientistic philosophy, No; scientific philosophy, Yes”. Philosophical Investigations, vol. 15, 2021, p. 30.

[26] Na presente introdução procurei demonstrar essa possibilidade ao explorar algumas relações entre as filosofias da tradição e entre elas e a filosofia e ciência contemporâneas. Um exemplo é ponte lançada entre a ontologia platônico-aristotélica (caps. II e III), a crítica nietzschiana da filosofia cristã (cap. XVI) e a metafísica naturalista de Donald Williams (cap. XIX).

 

 


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