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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

PALPITE SOBRE A ONTOLOGIA DAS ENTIDADES MATEMÁTICAS (esboço para discussão)

Rascunho para discussão em sala de aula – C. F. Costa – Aulas, graduação depto. filosofia, UFRN


PALPITE SOBRE A ONTOLOGIA DAS ENTIDADES MATEMÁTICAS
 (Como já dizia o velho Aristóteles, 'tudo começa com um palpite')

All numbers must be numbers of something: there are no such things as numbers in the abstract... All things possess quantity, so propositions concerning numbers are propositions concerning all things whatever.
Stuart Mill
 
     Um importante problema da filosofia da matemática é aquele concernente ao status ontológico de suas entidades, além da questão epistemológica da possibilidade de sua apreensão cognitiva. Ambos se encontram intrinsecamente associados.     Para começar podemos considerar duas posições aproximadas: o instrumentalismo e o convencionalismo. Segundo o instrumentalismo, o conhecimento matemático não é sobre coisas e suas relações. A matemática é um instrumento útil, mas não deveria ser entendida como referente a objetos matemáticos. Já segundo o convencionalismo, as verdades matemáticas são sobre como acordamos falar. Ou seja, estabelecemos convenções que mostram certas asserções matemáticas como verdadeiras e outras como falsas; mas isso não quer dizer que elas se refiram a algum objeto.      Uma alternativa oposta às consideradas acima é o realismo, seja ele platônico ou não. Para o realismo as proposições da matemática são sobre alguma coisa, embora não sejam sobre coisas físicas como cadeiras e mesas. Assim, números, conjuntos, funções, seriam objetos existentes, embora, diversamente dos objetos físicos, eles sejam atemporais e causalmente ineficazes.        
Todas essas posições são problemáticas. O platonismo encontra dificuldades, por exemplo, relativas à dificuldade que temos de compreender como é possível o acesso epistêmico a entidades causalmente ineficazes, que não são espacialmente nem temporalmente localizáveis. Quanto ao instrumentalismo e ao convencionalismo, fica difícil entender, respectivamente, a eficácia do instrumento e a razão da convenção quando se sustenta que a matemática não é sobre coisa alguma.     Para sair desse impasse, uma alternativa seria considerarmos objetos matemáticos entidades empíricas. O mundo inteiro é quantitativo. Quando estamos diante de um tomate, sabemos que se trata de somente um objeto. Quando nos é dado um conjunto de dois, três, quatro, até seis objetos, somos capazes de perceber de um relance quantos objetos temos diante de nós. Essa é uma capacidade que até os animais são capazes de possuir. 
    Todavia, essa é uma visão bastante crua. Embora os dois sapatos que estou usando instanciem o número dois, eles não são o número dois. Pois o número dois não depende da existência do meu par de sapatos para existir.
    Uma solução mais sofisticada, embora de fundo realista, foi proposta por Michael Resnick. Segundo esse autor, as entidades matemáticas são modelos (patterns) que podem ser exemplificados ou instanciados. As instanciações são perceptíveis pelos sentidos. Assim, sei que um cão tem apenas três patas porque as vejo e tenho uma apreensão sensível imediata desse número de patas. Mas os modelos não são apreensíveis dessa maneira. Eles são abstraídos das experiências de suas instanciações.
     A ideia tem seu apelo, pois uma criança aprende a contar e a adicionar números primeiro com base em objetos físicos que vê, para depois aprender a fazê-las na abstração da existência de tais objetos. Sendo uma espécie de adaptação do realismo ao caso dos objetos matemáticos (os modelos estão no lugar das idéias platônicas ou das formas aristotélicas), a sugestão de Resnick parece reconduzir-nos às dificuldades inicialmente mencionadas. Como podemos abstrair da experiência sensível algo que a transcende completamente? Que entidades imutáveis e atemporais são essas chamadas de modelos?
     A melhor alternativa me parece ser a de interpretar os modelos, as entidades matemáticas abstraídas, ainda em termos empiristas. Quais as razões pelas quais tendemos a não admitir que os modelos sejam entidades empíricas? Não há muitas, à exceção do horror mundi dos matemáticos. A principal delas é que as entidades matemáticas não têm a espécie de contingência de suas exemplificações. Se o inseto de oito patas perde uma delas o número oito não irá desaparecer por isso; esse número é independente de quaisquer coisas que o exemplifiquem.
     Mas considere a questão: se o mundo não existisse, existiriam números? Nossa tendência diante dessa impalpável questão é responder que não. Em outras palavras, embora exista uma independência do número em relação à realidade empírica, ela não exige considerarmos o número como algo que vá além dela. Basta para tal considerarmos a entidade matemática em termos de um caso qualquer empiricamente dado ou qualquer outro caso idêntico a ele, mas não como não exigindo coisa alguma empírica, a menos em nossa imaginação. Mesmo que o inseto de oito patas perca uma delas restará ainda um número indeterminado de exemplificações do número oito no universo. Com isso, embora nunca venhamos a sair do mundo empírico, nós ainda assim teremos estabilidade suficiente para não depender de contingências empíricas para que as entidades matemáticas existam. Considere, por exemplo, o número um: parece que se o mundo não existisse esse número não existiria; ele é, portanto, de certo modo permanente, eterno, imutável... sem para isso demandar o recurso a alguma espécie de realismo extra-mundano acerca de entidades abstratas.
    Essa maneira de ver a natureza ontológica das entidades matemáticas é compatível com a teoria dos tropos. Números são tropos modelares, embora não estejam no mesmo nível das qualidades empiricamente dadas como este azul, pois dependem delas para a sua exemplificação, ao menos enquanto não forem números grandes demais... 

Um comentário:

  1. Muito interessante o texto, professor. Contudo o sr. não indica a bibliografia para consulta quanto ao tema. O sr. pode adicionar?

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