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sábado, 1 de outubro de 2022

COGNITIVISMO SEMÂNTICO - Introdução

 Draft introdução de LIVRO A SER PUBLICADO PELA EDITORA APPRIS

 

 

 

 

COGNITIVISMO SEMÂNTICO

 

 filosofia da linguagem

 sob nova chave

 

 

 

Claudio Costa

 

 

 

 

 

 

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FICHA CATALOGRÁFICA:

 

Autor: Ferreira Costa, Claudio

Título da obra: Cognitivismo semântico: filosofia da linguagem sob nova chave,  2022.

 

Palavras chave: filosofia da linguagem, nomes próprios, referência, significado

 

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To have, with decency, knocked

That a Blunt should open

To have gathered from the air a live tradition

Or from a fine old eye the unconquered flame

This is not vanity

Here error is all in the not done

All in the diffidence that faltered…

 

[Ter com decência se esforçado

Para que algo notável viesse à luz

Ter colhido no ar uma tradição viva

Ou de um óleo antigo a flama inconquistada

Isso não é vaidade

Aqui o erro está todo em não ter feito

Todo na difidência que fez hesitar...]

 

Ezra Pound

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SUMÁRIO

 

 

                   PRÓLOGO

 

 

              PARTE I: TERMOS SINGULARES

 

1.     CLASSIFICANDO OS TERMOS SINGULARES

2.     TERMOS INDEXICAIS

3.     DESCRIÇÕES DEFINIDAS

4.     TEORIA DESCRITIVISTA DOS NOMES PRÓPRIOS

5.     TEORIA CAUSAL-HISTÓRICA DOS NOMES PRÓPRIOS

6.     TEORIA METADESCRIPTIVISTA DOS NOMES PRÓPRIOS

 

 

         PARTE II: TERMOS GERAIS

 

7.      INTRODUÇÃO: DESCRITIVISMO VERSUS CAUSALISMO

8.      PUTNAM: TERRA GÊMEA E A FALÁCIA

      EXTERNALISTA

9.      IRREGULARIDADES DO TERRENO CONCEITUAL

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

PRÓLOGO

 

 

Meu primeiro encontro com as teorias filosóficas dos nomes próprios aconteceu há mais de trinta anos, quando me encontrava na Alemanha escrevendo uma tese sobre a concepção de significado na última filosofia de Wittgenstein. Como seria de se esperar de um neófito recém-convertido, a melhor resposta parecia-me ser a teoria do feixe de descrições definidas, tal como fora comentada pelo próprio Wittgenstein na seção 79 de suas Investigações Filosóficas. Por contraste, as poucas leituras que fiz na época sobre a concepção causal-histórica da referência dos nomes próprios proposta por Saul Kripke me deixaram escandalizado. O recurso ao batismo e às cadeias causais externas soava-me como uma explicação mágica da referência. Não que eu me sentisse à vontade com a teoria do feixe. Minha opinião era a de que seria necessário impor uma ordem ao apanhado arbitrário de descrições constitutivas do feixe e que isso só poderia ser feito pelo recurso a alguma regra de ordem superior, capaz de estabelecer o papel e o valor das descrições a ele pertencentes. Mas logo me esqueci do assunto.

   Só voltei a me interessar pela questão dos nomes próprios em 2006, por razões meramente acidentais. Lembrei-me então de meu antigo projeto. Escrevi um breve esboço no qual enfatizava o fato de que as descrições definidas pertencentes ao feixe deveriam ser interpretadas como expressões de regras de conexão do nome próprio com o seu objeto de referência. Mais do que isso, me pareceu que em seu aparato cognitivo qualquer falante competente deveria possuir de forma implícita uma regra de ordem superior, uma regra meta-descritiva para nomes próprios, capaz de conferir papel e valor aos diversos tipos de regra-descrição constitutivos de cada feixe de descrições associado a cada nome próprio. Tal regra meta-descritiva teria de se aplicar sobretudo a regras-descrições espaciotemporalmente localizadoras e caracterizadoras da razão pela qual o portador de um nome próprio é referido.

   Apresentei meu esboço em várias ocasiões, sempre surpreso com a forte reação adversa da maioria dos ouvintes. Contudo, como ninguém me apontava um erro palpável e como um pouco de reflexão me mostrava que as objeções poderiam ser facilmente respondidas, prossegui. A teoria metadescritivista dos nomes próprios daí resultante encontra-se exposta no Capítulo 6 do presente livro, sendo o que ele tem de mais interessante a oferecer. Embora essa teoria não deixe de incorporar intuições provenientes da concepção causal-histórica, ela as condiciona a ideias de fundo claramente descritivista, o que faz com que se deixe melhor classificar como uma elaboração muito mais satisfatória da velha teoria do feixe de descrições.

   A teoria metadescritivista dos nomes próprios tem a sua maior complexidade justificada por sua coerência interna, além da posse de um poder explicativo claramente superior ao das teorias anteriores. Entre os bons atributos que a recomendam encontram-se: (i) ser capaz de explicar adequadamente como e porque o conteúdo semântico-cognitivo (sentido) do nome próprio pode contribuir para a identificação de seu portador (objeto ou referência); (ii) ser capaz de gerar a ideia de que nomes próprios são designadores rígidos do próprio interior do descritivismo; (iii) ser capaz de explicar, sob uma perspectiva descritivista, como e por que se dá o contraste entre a rigidez dos nomes próprios e a acidentalidade das descrições definidas e, finalmente, (iv) ser capaz de responder de forma plenamente convincente aos mais importantes exemplos já levantados contra a teoria do feixe.

   A resposta à questão da natureza do nome próprio é uma pedra angular da filosofia da linguagem. Se ela for alterada, tudo se altera. A teoria causal-histórica dos nomes próprios, advogada por Saul Kripke, Keith Donnellan e outros, produziu uma verdadeira revolução na maneira como entendemos outras expressões referenciais fundamentais, que são as descrições definidas, os indexicais, os termos gerais e mesmo os enunciados, inaugurando uma nova ortodoxia causalista e externalista em filosofia da linguagem. Se proponho uma teoria neodescritivista (metadescritivista) dos nomes próprios que se revele verdadeiramente convincente, o que estou sugerindo traz em seu cerne uma contra-revolução de fundo descritivista-cognitivista, que promete responder de modo mais satisfatório os problemas que a nova ortodoxia tem gerado desde a década de 1970. Essa é, creio eu, a explicação última da reação de rejeição de parte de ouvintes diante da proposta de uma teoria metadescritivista dos nomes próprios: ela demanda uma inversão da perspectiva hoje mais comum.

   Isso também explica as direções que minha pesquisa precisou tomar em seguida. Uma vez que me encontrava investigando a função dos nomes próprios, meu interesse teve de se alargar para a história das teorias descritivistas, bem como para a necessidade de alcançar um entendimento crítico da concepção causal-histórica que fizesse justiça ao trabalho exponencial de Kripke.

   A investigação do funcionamento dos nomes próprios inevitavelmente me levou a considerar outras expressões referenciais, como descrições definidas, termos indexicais e mesmo termos gerais, onde a mesma disputa entre a nova ortodoxia do referencialismo causal-externalista e a velha ortodoxia do cognitivismo descritivista-internalista é mantida. Minha pergunta foi irreprimível. Se havia obtido tão bons resultados defendendo uma espécie de cognitivismo metadescritivista essencialmente internalista para o caso dos nomes próprios, por que semelhante maneira de ver não seria capaz de produzir resultados igualmente interessantes quando aplicada a outras expressões referenciais? A tarefa me parecia imensa, mas a intuição era boa, de modo que decidi considerar também essas questões. O objetivo era duplo. De um lado, queria demonstrar as limitações das teorias referencialistas-externalistas aplicadas a outros termos referenciais; de outro, considerando as objeções, queria desenvolver explicações basicamente cognitivistas-internalistas mais convincentes para os modos como descrições definidas, indexicais e termos gerais referem, mesmo que ainda incompletas.

   Alguns resultados podem ser de interesse. Entre eles estão a compatibilização do descritivismo de “Russell” com o de “Frege”; uma defesa neofregeana da irrelevância das incongruências não-convencionais em um resgate descritivista do conteúdo semântico “fregeano” dos indexicais, por oposição à tese de John Perry da essencialidade do indexical; a tese da plasticidade do pensamento; uma crítica linguística detalhada à teoria externalista do significado de Putnam e, em complemento a isso, a proposta da existência de regras meta-descritivas por vezes análogas às dos termos singulares na constituição de regras de atribuição de termos gerais.

   Trata-se, como creio, de algo que nos aproxima um pouco mais de um conhecimento apto a obter consenso; mais aproximado, portanto, daquilo que em um linguajar genérico chamamos de ciência. Ainda assim, boa parte do que aqui se encontra escrito não vai muito além de esboços rudimentares, que lanço na espectativa de que possam ser melhor desenvolvidos por outros. Assim deve poder ser, dado que filosofia é work in progress por definição.

   Ao trabalhar com essas questões percebi, em retrospecto, que aquilo que estava tentando fazer poderia ser entendido como a retomada de um programa especulativamente desenvolvido por Ernst Tugendhat em seu clássico livro Vorlesungen zur einführung in die sprachanalytische Philosophie (Lições introdutórias à filosofia analítica da linguagem), publicado em 1976 – um programa que pode ser considerado o canto de cisne da velha ortodoxia em filosofia da linguagem. Essa velha ortodoxia teve seus inícios com Frege, Russell e Wittgenstein, tendo prosseguido com P. F. Strawson e John Searle,  foi fortemente influente até a década de 1980, pelo menos. Contudo, ela acabou perdendo sua força, à sombra do domínio sempre crescente das concepções externalistas e não-descritivistas do acesso à referência que foram revolucionariamente desenvolvidas na década de 1970 – a nova ortodoxia comandada por filósofos como Saul Kripke, Hilary Putnam e David Kaplan.

   Retomando de forma mais clara uma ideia já defendida na interpretação que Michael Dummett fez de Frege, Tugendhat sugeriu em seu livro que se entendesse o programa da velha ortodoxia como sendo, para o caso fundamental da frase enunciativa predicativa singular, o de analisar o sentido cognitivo (Sinn) do termo singular como sendo a sua regra de identificação (Identifikationsregel), o sentido cognitivo do termo geral como sendo a sua regra de aplicação (Verwendungsregel) – que prefiro chamar de regra de atribuição – e o sentido cognitivo ou epistêmico (epistemisches Gehalt) da frase enunciativa predicativa singular completa como sendo a sua regra de verificação (Verifikationsregel). Essa última regra poderia ser entendida como a resultante da aplicação combinada das duas primeiras (da regra de identificação, que identificaria o objeto ao qual se aplicaria a regra de atribuição), o que foi concebido por Tugendhat como uma maneira analiticamente aprofundada de se falar da verificação em termos de significado e, ultimadamente, da verdade no sentido tradicional de correspondência (nada a ver aqui com as objeções feitas à espécie de verificacionismo dos positivistas lógicos!). Ora, meu objetivo deixa-se também explicar como sendo o de justificar e analisar em algum detalhe cada uma dessas regras em sua natureza, estrutura, subdivisões e relações, além de tentar esclarecer seu status ontológico, assim como atributos a elas relacionados, como os de existência e verdade.

   Essas são as estações do presente texto, que foi escrito na intenção de ser entendido por leitores que, apesar de versados em filosofia, não precisassem possuir conhecimento especializado de filosofia da linguagem.

   Em adição, devo observar que o trabalho com esse livro foi interrompido em 2011 para que me fosse possível escrever dois livros em inglês: Lines of Thought: Rethinking philosophical assumptions (2014) e Philosophical Semantics: Reintegrating Theoretical Philosophy (2018). Os conteúdos dos três livros são parcialmente inclusivos e complementares. Estou convencido de que juntos eles oferecem uma chave sistemática mais plausível para a solução de alguns problemas resilientes da filosofia linguístico-analítica contemporânea, uma chave em grande parte baseada na escolha de uma variedade de pressupostos teóricos prima facie mais plausíveis. (Daí o grande número de referências cruzadas no presente texto.)

   Um único exemplo para ilustrar a complementariedade em questão: foi só no livro Philosophical Semantics que tratei do enunciado completo, que não deixa de ser um caso especial de expressão referencial. O significado cognitivo do enunciado foi lá analisado em termos de regras verificacionais, o que foi feito juntamente com uma crítica a entendimentos formalistas seriamente equivocados que filósofos do Positivismo Lógico e sua descendência (que vem pelo menos de W. V. Quine a Saul Kripke, passando por Donald Davidson) tiveram do verificacionismo semântico originariamente proposto por Wittgenstein. Esses entendimentos equivocados geraram críticas igualmente equivocadas e, no final das contas, uma rejeição enganosa, posto que bloqueadora dos caminhos da investigação concernentes ao modo mais natural e potencialmente frutífero, em meu juízo inevitável e único, de se analisar significados cognitivos de sentenças assertivas sem ter de reaplicar o próprio conceito de significado. Finalmente, também no livro Philosophical Semantics foi esboçada uma versão genuinamente abrangente da teoria correspondencial da verdade que se demonstrava compatível com o verificacionismo semântico. Tugendhat, admitindo essa mesma compatibilidade, demonstrou-se mais uma vez presciente.

 

Natal 2022

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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