VI
POR UMA TEORIA ABRANGENTE:
BUSCANDO INTEGRAR AS CONFIGURAÇÕES CRITERIAIS
Neste capítulo, reunimos os resultados obtidos na busca por uma
explicação descritivista integrada da natureza da filosofia. Partindo da hipótese
inicial de que a filosofia emerge de três polos de atividade cultural, essa abordagem
oferece uma compreensão mais clara e precisa das principais configurações
criteriais que orientam a identificação do discurso e do pensamento
filosóficos.
1. FILOSOFIA
COMO ATIVIDADE
CULTURAL DERIVADA
Entendo por prática cultural um conjunto
recorrente de atividades sociais que operam predominantemente em níveis afetivo-cognitivos.
Embora não estejam diretamente voltadas à satisfação das necessidades práticas
da vida, essas atividades se sustentam sobre o pano de fundo dos interesses coletivos
que moldam nossas formas de vida. Nesse contexto, torna-se evidente que a
filosofia compartilha traços com três práticas culturais fundamentais, a
saber:
a) CIÊNCIA,
b) RELIGIÃO,
c) ARTE.
Considero essas práticas as mais fundamentais em
virtude de sua relevância e de seu caráter originário no contexto da vida
humana em sociedade. Outras práticas culturais, sejam elas lúdicas, como esportes
e jogos sociais; cotidianas, como os modos de vestir e a gastronomia; ou tradicionais,
como festas populares e ritos de passagem, ocupam posição secundária, pois resultam
de combinações com elementos que não se definem propriamente como culturais,
tais como o entretenimento, o trabalho, a alimentação, a ordenação social.
Ao reconhecer
o caráter fundamental dessas três práticas culturais – ciência, religião e arte
– surge uma questão inevitável: seria a filosofia uma quarta atividade cultural
fundamental, situada no mesmo nível da ciência, da religião e da arte, embora
distinta delas? Filósofos do passado tentaram conferir à filosofia um status
próprio, autônomo e, por vezes, superior ao das demais práticas. No entanto,
essas tentativas nunca se demonstraram inteiramente convincentes.
As reflexões anteriores sobre o
caráter protocientífico da filosofia, sua herança religiosa e os aspectos
estéticos de seu discurso conduzem a uma conclusão clara: não é adequado
atribuir à filosofia o estatuto de prática cultural autônoma. Reconhecemos,
portanto, a existência de apenas três formas fundamentais de atividade cultural,
sendo a filosofia, em última instância, uma prática derivada, tanto em suas
motivações quanto no material que mobiliza e nos procedimentos metodológicos que
emprega.
O lugar da filosofia em relação às práticas
culturais mais fundamentais pode ser comparado, em certa medida, ao da ópera
entre as formas essenciais da arte. A ópera é um gênero que combina música, drama
e poesia. De modo análogo, a filosofia pode ser concebida como uma prática
cultural que articula elementos provenientes da ciência, da religião e da arte.
Assim como a poesia não é estritamente necessária à ópera (ao contrário da música
e do roteiro dramático), o componente artístico externo também não chega a ser
estritamente indispensável à constituição da filosofia. O componente artístico externo
é muito pouco presente, por exemplo, no tomismo medieval.
Como toda analogia, a comparação com a ópera tem
seus limites. Embora música, enredo e poesia se combinem para produzir um efeito
mais impactante, esses elementos podem ser facilmente dissociados no contexto
operístico. É possível, por exemplo, apreciar uma ária em versão para piano.
Pensemos, por exemplo, na esplêndida paráfrase do Rigoletto composta por
Liszt. Também podemos ler e admirar grandes estrofes poéticas como, digamos, E
lucevan le stelle, sem conhecer a música. E ainda é possível ler o resumo de
um enredo, como o da ópera bufa L’elisir d’amore, e não se encantar com
ele.
O mesmo, porém, não se aplica com igual facilidade
à filosofia. Ela não se configura como uma simples colagem de elementos voltados
à aproximação da verdade científica (incluindo a do senso comum humilde da qual
é extensão), junto à expressão da ambição místico-religiosa de compreender o
todo, eventualmente harmonizada por meios estéticos. Por outro lado, tampouco se
configura como uma combinação perfeita e original dos componentes dessas práticas
culturais, como se fosse um composto químico completamente novo, formado a partir
de moléculas distintas.
Ainda assim, é perfeitamente possível reescrever
a mensagem do mito da caverna de Platão, abstraindo-a de qualquer componente artístico
externo. Da mesma forma, um filósofo analítico pode isolar o esqueleto
estrutural da filosofia de Hegel, desconsiderando a imensa carga sugestiva de seu conteúdo. Mas não parece possível dissociar
o elemento veritativo de sua abrangência. Talvez aqui a analogia com uma
amálgama nos ofereça uma analogia mais precisa.
Na amálgama química, os elementos não são simplesmente misturados ao acaso,
tampouco combinados para formar um composto inteiramente novo. Eles são
fundidos de maneira tal que as propriedades macrofísicas do conjunto se
transformam significativamente. A amálgama de prata, por exemplo, resulta da
fusão de proporções específicas de mercúrio, prata, estanho, cobre e, ocasionalmente,
zinco — cristalizando-se em uma estrutura coesa e resistente.
Algo semelhante pode ser sugerido
em relação às teorias filosóficas: elas parecem reunir elementos diversos,
articulando-os de modo a constituir um todo coeso e intelectualmente fértil, capaz
de gerar reações interpretativas e reflexões de considerável interesse. Ainda
assim, permanecem como práticas culturais derivadas, pois dessa unificação de elementos
não emergem elementos intrinsecamente originais, a originalidade residindo na
combinação e em seus efeitos.
2. UMA EXPLICAÇÃO INTEGRADA DA
ATIVIDADE FILOSÓFICA
Buscando substituir as analogias anteriores por uma formulação mais literal,
proponho que a filosofia seja compreendida como espécie derivada de atividade cultural,
tanto em suas motivações, quanto no material semântico que
mobiliza e nos procedimentos metodológicos que emprega.
No que concerne às motivações, a filosofia revela
uma tripla derivação:
(A) da curiosidade inquisitiva associada às formas científicas de investigação,
isto é, ao desejo de adquirir um conhecimento consensual, validado por sua efetiva
capacidade de explicar, prever e manipular a realidade;
(B) de motivações originalmente religiosas, que incluem o impulso de integrar
nossas experiências e prover uma visão imaginativa e abrangente do mundo e da
condição humana. Essa disposição manifestou-se claramente em Platão, por meio
do apelo a uma realidade transcendente, situada além da experiência ordinária,
capaz de organizar e orientar nosso acesso ao mundo. Ela também se faz presente
nos grandes sistemas filosóficos da tradição, aparecendo, de forma mais sutil e
velada, mas ainda assim discernível, na concepção wittgensteiniana da filosofia
como busca por uma representação panorâmica (übersichtliche Darstellung)
da forma como vemos o mundo, ou seja, por um entendimento integrador daquilo que
já sabemos[1];
(C) da arte, em sua aspiração por efeitos motivacionais de natureza “catártica”,
ainda que esses efeitos pareçam, em última instância, estar também a serviço
das demais motivações.
No que diz respeito ao material semântico-conceitual – os data primários
a serem considerados – também ele não se origina propriamente da filosofia, pelas
seguintes razões:
(A) Parte desse material corresponde aos dados do nosso mundo natural,
físico, mental ou mesmo formal, acessíveis por meio da experiência ordinária,
quando não decorrentes de informação científica. Como discutido no capítulo IV,
no caso dos conceitos naturalistas de entidades-princípio [–A+B], esses dados podem,
de fato, constituir todos os elementos relevantes a serem considerados.
(B) No caso de conceitos metafísicos híbridos [+A+B], vemos que a filosofia
pode recorrer a propriedades teomórficas (como transcendência, hipermentalidade,
entre outras) originariamente presentes na constituição dos seres espirituais venerados
religiosamente. Essas propriedades, tratadas como “abstrações personalizadas”,
passam a funcionar como dados elementares ou como indicativos deles. De
nosso ponto de vista, o material semântico teomórfico nada mais é do que uma modificação
do material extraído da experiência comum ou mesmo da experiência científica –
física, mental ou formal –, incorporado à constituição semântica de conceitos metafísicos
híbridos, ainda que esse movimento costume ser negado.
(C) O material semântico sugestivo externo é constituído pelos recursos
literários os mais diversos, que funcionam como elementos metodológicos de
natureza estetizante. Essas construções costumam depender ainda de um componente
metafórico interno, constituído por entidades-princípios que parecem essenciais
à reflexão filosófica tradicional e responsáveis por inevitáveis aporias.
Passemos agora aos procedimentos metodológicos, que tampouco são originariamente
filosóficos, pois:
(A) Em filosofia, esses procedimentos não se distinguem essencialmente
dos procedimentos ordinários irrefletidos, nem dos procedimentos das ciências
formais ou empíricas. O método geométrico adotado por filósofos racionalistas
como Descartes e Spinoza, refletiu uma abordagem apriorista que mimetizava os procedimentos
axiomáticos das matemáticas. Por outro lado, o método histórico dos filósofos
empiristas (tais como Locke e Hume, baseava-se fortemente na introspecção e em dados
empíricos sobre o mundo e o comportamento humano. Essa oposição persiste até
hoje se compararmos, por exemplo, a diferença entre o viés formalista de Saul Kripke
e o viés empirista de John Searle. Embora aplicados de modo mais ou menos
conjectural, esses métodos compartilham as mesmas origens dos procedimentos das
ciências formais e empíricas. (Instrumentos analíticos contemporâneos, como os
métodos formais ou as teorias pragmáticas, tampouco são propriedade exclusiva
da filosofia.)
(B) Como vimos no capítulo IV, o raciocínio filosófico comumente repousa
na assunção de princípios metafísicos, os quais podem ser representados por
três tipos de conceitos. O conceito metafísico incoerente (ou seja, [+A+B]),
o conceito carente de sentido (ou seja, [–A–B]), e o conceito meramente indeterminado
(ou seja, [–A+B]. Os dois primeiros preservam, respectivamente, traços dos
seres sobrenaturais insuficientemente coerentes e incognoscíveis da religião. Em
geral, os conceitos [+A+B] e [–A–B] predominam na metafísica transcendente e no
racionalismo, enquanto os conceitos do tipo [–A+B] se mostram mais compatíveis
com o naturalismo e o empirismo.
(C) A expressão interna da imaginação criativa desinteressada, no âmbito
conceitual, manifesta-se, em geral, por meio de elaborações originais de pensamento
– traço recorrente da criação estética. Trata-se aqui da filosofia como a “arte
da razão”, que emprega conceitos, juízos e raciocínios com finalidade
expressiva, capaz de desdobrar-se em ressonâncias cognitivas.
As colunas do seguinte diagrama sumarizam as principais propriedades pertencentes
ao discurso e pensamento filosóficos:
FILO- MOTIVAÇÃO
MATERIAL
PROCEDIMENTOS
SOFIA SEMÂNTICO
SOFIA
(DATA)
(A) da Curiosidade eu- Dados obtidos
a par- Uso de hipóteses
CIÊN- rística
voltada ao tir da
experiência e do raciocínio
CIA conhecimento comum
e científica, argumentativo.
real
do mundo. formal ou empírica.
(B) da Desejo de uma
Traços teomórficos, Recurso à crença
RELI- concepção abran- (hipermentalidade, em princípios
GIÃO gente, que ordene hiperfisicalidade e transcendentes
em nível
profundo idiossincrasia mente- à exortação ou a
o mundo e a vida. Corpo),
admitidos alguma
forma de
como princípios. experiência mística.
(C) Da Desejo de
expe- elementos
simbólicos Aplicação
de re-ARTE riência
“catártica” carregados
de cursos
metafóricos
Harmonizadora de sugestividade
Esse diagrama demonstra que a filosofia, longe de constituir uma atividade
cultural autocontida, opera por meio da apropriação de elementos oriundos de
outros domínios da cultura humana. Interpretamos os três níveis horizontais representados
no diagrama como expressões de três possíveis dimensões da indagação filosófica:
(A) Uma dimensão veritativa ou
cientificamente orientada, que é composta por conjecturas que buscam
antecipar o saber consensual da ciência;
(B) Uma dimensão misticizante,
ampliacionista ou holisticamente orientada, que abarca especulações e princípios
metafísicos não-fundamentados, frequentemente problemáticos sob o aspecto cognitivo
e geralmente admitidos como matéria de crença;
(C) Uma dimensão estetizante ou esteticamente orientada, que manipula
criativamente o medium do discurso filosófico, de modo a sugerir
externamente possibilidades e ampliar sua eficácia expressiva, ao mesmo tempo
em que estimula internamente a produção metafórica de princípios (do “ser” de
Parmênides ao “Ser” de Heidegger, passando pelo “indizível” de Wittgenstein).
A consideração dessas dimensões torna mais explícitos os novelos conceituais
envolvidos na identificação do discurso filosófico a partir de uma perspectiva metafilosófica
descritivista. Revendo os três níveis uma última vez, agora em maiores detalhes:
(A) Dimensão veritativamente orientada
Essa primeira dimensão, originada entre os pré-socráticos de uma ideia
da ciência, é motivada pela curiosidade científica, racional, realista
e operativa, voltada à obtenção de resultados efetivos. Constitutivamente
direcionada à verdade científica, caracteriza-se por um enfoque cognitivo,
heurístico, veritativo. Fundamenta-se sobretudo em generalizações por vezes
capazes de obter um relativo consenso, seguidas de argumentos que visam demonstrar
suas possíveis implicações e reforçar sua plausibilidade por meio da consistência
com os resultados obtidos.
Essa tarefa é sempre realizada sob
o pressuposto – presente ou imaginado – de uma comunidade crítica de ideias,
cuja função mediadora é essencial na busca por um consenso autêntico, efetivamente
alcançado somente pela ciência. É justamente pelas limitações inerentes a essa
dimensão que a filosofia se distingue negativamente da ciência: por não atender
às condições de compartilhamento de pressupostos básicos, de avaliação consensual
da verdade e de progresso entendido como acumulação de crenças admitidas como verdadeiras
por sua comunidade crítica (ver cap. III). Essa primeira dimensão é por
excelência argumentativa e investigadora, apoiando-se em enunciados constatativos.
As
duas dimensões seguintes, contudo, deixam de ser essencialmente cognitivas,
apoiando-se predominantemente de proferimentos performativos.
(B) Dimensão misticizante, ampliacionista
ou holisticamente orientada
O impulso motivacional inicial dessa dimensão
da indagação filosófica reside na curiosidade especulativa
voltada à ampliação do horizonte reflexivo, sem, contudo, comprometer a profundidade,
sendo frequentemente acompanhada por um desejo de transcendência. Trata-se de
uma abordagem que muitas vezes incorpora elementos não-racionais e não-cognitivos.
Tais elementos afetam a especulação filosófica, sobretudo aquela que recorre a entidades-princípio
metafísicas de natureza híbrida ou elusiva, mas também, em alguma medida, as investigações
de cunho naturalista.
Recorrendo a uma metáfora wittgensteiniana,
essa dimensão ampliativa não seria a do que pode ser dito, mas do que
pode ser apenas mostrado. Sendo cognitivamente elusivos, os princípios metafísicos
acabam podendo ser passíveis de demonstração indireta, ainda que, é verdade, com
o auxílio da linguagem articulada. A dimensão (B) é, em seus fundamentos, exortativa,
nesse sentido, mais voltada a uma função performativa do que à verossimilitude.
(C) Dimensão esteticamente orientada.
Essa dimensão incorpora elementos estéticos externos que enriquecem o
conteúdo enunciado, sugerindo possibilidades cognitivas por meios imaginativos
e literários. Internamente, ela se estrutura em torno de uma conceitologia
metafórica, de entidades-princípios insuficientemente explicadas e de suas
inevitáveis aporias. Esse elemento interno metafórico costuma unir a dimensão
(C) à (B), pois os princípios são o que mais propicia a orientação holística. A
dimensão (C) possui um fundamento expressivo que lhe confere um caráter
performativo.
1. O TRIÂNGULO METAFILOSÓFICO
Meu argumento a favor de uma configuração criterial correspondente à
dimensão veritativamente orientada, foi apresentado no capítulo III. Já os argumentos
que sustentam as configurações criteriais para as duas outras dimensões – a totalizadora
e a estetizante – foram apresentados respectivamente nos capítulos IV e V. A questão
que agora se impõe é: como podemos organizar essas configurações de um modo que
isso nos ajude a identificar o que mais conta como filosofia no sentido historicamente
central da palavra – aquele que nos foi legado pela tradição? E a que somos
conduzidos se variarmos o peso de cada configuração criterial em relação às demais?
Minha hipótese é que, para que
algo se caracterize como filosofia no sentido tradicional, é necessário que haja,
pelo menos em alguma medida, a presença de configurações criteriais veritativas,
ampliativas e estetizantes, ainda que a predominância de cada uma dessas
configurações possa variar significativamente, conforme a espécie de filosofia
que se tenha em consideração. Quero argumentar a favor disso.
Considere o caso das configurações criteriais,
que constituem a dimensão veritativamente orientada. Sua presença pode ser vista
como uma condição necessária para que algo possa ser chamado de ‘filosofia’
no sentido tradicional da palavra ou em qualquer outro sentido legítimo. (Filósofos
pós-modernos chegaram a negar a pretensão de verdade, mas como eles nos querem convencer
de algo, eles querem no mínimo nos convencer de que é verdade que a verdade não
existe.[2])
Mas seria possível que a mera presença da dimensão
criterial veritativa fosse suficiente para constituir a filosofia, como desejavam
os positivistas do Círculo de Viena?[3]
A resposta é negativa. Eis por que: a curiosidade científica não se confunde
com a curiosidade especulativa. Esta última, como resultado do que Freud chamou
de processo primário, concede à imaginação direitos especiais. A curiosidade
científica, que seria a dimensão veritativa, quando tomada em isolamento das
demais, não conduz ao tipo de empreendimento conjectural, amplo e indiferente a
consensos, que caracteriza a filosofia em seu sentido mais pleno.
Mas, se é assim, os elementos criteriais
constitutivos da dimensão ampliativa também se revelam indispensáveis a uma forma
apropriada de indagação filosófica. Mesmo no âmbito de filosofias naturalistas,
como o atomismo de Demócrito e o ceticismo de Hume, que poderíamos representar
pela fórmula do tipo [–A+B], há uma inevitável filiação aos mesmos impulsos
que, em circunstâncias diversas, deram origem ao imaginário místico-religioso
do qual a filosofia se originou.
No âmbito da dimensão esteticamente orientada,
nossas reflexões sobre o papel da arte em filosofia conduzem à hipótese de que o
elemento artístico constitutivo do que foram chamadas de similaridades internas,
quando transposto para o domínio do intelecto, termina por revelar-se imprescindível.
A criatividade filosófica, no plano conceitual, as entidades-princípios pelas
quais ela se manifesta, só se tornam formas de teoria capazes de comunicar algo
relevante se forem semanticamente sugestivas, polissêmicas, abertas a uma variedade
de interpretações. Mesmo filósofos como Gottlob Frege, cujo texto não parece
possuir nenhuma dimensão artística, possuem conceitos-chave e dizeres dotados de
alguma carga semântica evocativa. O próprio fato de precisarem ser
interpretados é prova disso.
Entretanto, é preciso lembrar que a presença
de algum elemento holístico-estetizante em qualquer construção filosófica não
nos deve tornar indulgentes diante da ênfase excessiva no elemento artístico-retórico
externo, quando dissociado do elemento estetizante interno essencial. Tal
desequilíbrio ocorre quando nos encontramos diante de meras simulações
descompromissadas de uma argumentação filosófica consistente. Exemplo emblemático
é boa parte da obra de Jacques Derrida, ainda que seja legítimo reconhecer que
ele tinha razão ao afirmar que seu sonho mais antigo e profundo era deixar um rastro
na história das letras francesas.[4]
As variações na importância de
cada dimensão podem ser ilustradas por meio do triângulo metafilosófico sugerido
na apresentação desse livro, cujos vértices representam as atividades culturais
fundamentais, enquanto as diferentes filosofias se posicionam em seu interior:
CIÊNCIA

FILOSOFIAS
RELIGIÃO ARTE
À filosofia pertence tudo o que se encontra no interior do triângulo
metafilosófico. As setas indicam que as relações entre as dimensões são historicamente
dinâmicas. Com o passar do tempo, explicações de cunho religioso foram gradualmente
cedendo espaço a explicações filosóficas, apoiadas em um recurso estético aos
poucos tornado menos operante. E os remanescentes religiosos da filosofia foram
sendo gradualmente substituídos por formas de indagação que, aos poucos, se
subdividiam ao se aproximarem do modelo consensual da ciência.
Como mostra a figura, a atividade e o discurso
filosófico encontram-se profundamente associados à expressão estética, se não
externamente, pelos recursos literários, ao menos internamente, pela atividade
criativa que apela a conceitos abertos e à polissemia estética na produção de
entidades-princípios que requerem trabalho interpretativo. Contudo, à medida
que a indagação filosófica se aproxima do discurso consensual da ciência, a expressão
artística tende a perder sua força, sendo substituída por formas mais diretas e
precisas de apresentação. Trata-se, obviamente, de um processo meramente tendencial,
acompanhado de retrocessos parciais e, por vezes, profundos.
O quase imperceptível processo de substituição
da filosofia pela ciência deixa marcas na história do objeto. Ninguém mais escreve
filosofia em forma de poesia, como Parmênides ou Lucrécio. A forma de diálogo, que
outrora cumpria uma função estética, já havia perdido sua importância bem antes
dos Dialogues Concerning Religion de Hume (1779), cujo propósito principal
era disfarçar seu ateísmo. O advento da filosofia analítica tornou o discurso filosófico
ainda menos receptivo ao elemento artístico.
É certo que, em oposição a essa tendência, críticos
poderiam evocar nomes como os de Nietzsche, Sören Kierkegaard, Walter Benjamin,
Martin Heidegger e mesmo Wittgenstein, ainda que nenhum deles tenha sido atuante
nos últimos oitenta anos. Mas os primeiros dois filósofos faziam filosofia da
vida e da existência, algo cujo objeto é de natureza mutável, escapando facilmente
à sua captura por qualquer forma de objetividade científica. Benjamin, considerado
por Theodor Adorno um teórico fraco, foi, sobretudo, um literato de estilo incomparável,
com forte inclinação filosófica. Muito diversamente, Jürgen Habermas, da mesma Escola
de Frankfurt, foi mais longe do que os outros membros da escola, atendo-se ao
rigor argumentativo, mesmo que a custa de inevitável obscuridade. E Heidegger produziu
uma antropologia social sob a forma de prédicas religiosas, nas quais o termo ‘Deus’
foi substituído pela palavra ‘Ser’.
Wittgenstein foi um caso à parte: um filósofo exponencial
e, junto a Frege e Russell, um dos fundadores da filosofia analítica. É verdade
que, com a ambição de abrangência misticizante própria de sua filosofia, era
compreensível que ele se opusesse ao movimento anti-estetizante e anti-metafísico,
percebendo no positivismo vienense expressão de decadência da alta cultura e uma
perversão cientificista, tão degradada quanto seu oposto reativo – o irracionalismo,
fosse ele niilista ou místico. No entanto, há um custo em seu procedimento:
suas metáforas e exemplos são, em geral, profundos e bem orientados, mas, como
já se observou, ele frequentemente interrompe seus fragmentos argumentativos
sem desenvolvê-los suficientemente. Os resultados são mais recomendações do que
argumentos. Por isso, insisto: o que o exemplo de Wittgenstein e os outros
acima revelam é que a filosofia ainda não é ciência. E, ao nos voltarmos para
os domínios historicamente centrais da filosofia – metafísica, epistemologia e
ética –, os elementos artísticos e religiosos tendem a perder força à medida que
esses domínios se aproximam de um terreno de consenso. Mas isso é feito de modo
gradual e oscilante, no caso de Wittgenstein, com um retrocesso bem justificado
contra a especialização precoce que caracteriza o cientismo positivista.[5]
Mas, nesse
caso, como sustentar a tese de que a filosofia, em seu centro de gravidade histórico,
possa ser completamente substituída pela ciência? Pessoalmente, creio que sim, ainda
que seja algo impossível de demonstrar. Afora isso, temos o caso das filosofias
que dizem respeito a processos temporais destinados a se prolongar no futuro,
exigindo, por isso, que seus desenvolvimentos teóricos permaneçam abertos; há
também as sempre emergentes novas formas secundárias ou aplicadas de filosofia;
há também o caso de filosofias de ordem superior que se seguem à formação de cada
nova ciência particular; por fim, permanece em aberto a questão da própria finitude
do conhecimento possível.
2. PARA EXEMPLIFICAR
Penso
em trazer agora alguns exemplos confirmatórios do que já foi sugerido, ciente
de que, em filosofia, a repetição pode ser saudável.
Como vimos, a filosofia extrai da prática cultural
religiosa sua motivação ampliacional, de abrangência e profundidade. O “espanto”
(thauma) do qual, segundo Aristóteles, nasce a filosofia, vincula-se a
essa mesma fonte. A ambição ampliacional contém um fator integrador, perceptível
no desejo de direcionar as conjecturas rumo à maior amplitude possível, ao inefável
conjunto da realidade.
Assim,
quando o filósofo busca “uma explicação última do universo e do lugar que o homem
nele ocupa” (Aquino), quando se pergunta “de onde viemos, quem somos, para onde
vamos” (Gauguin), ou ainda quando formula a questão “por que o ente e não antes
o nada?” (Heidegger; Leibniz), o que vemos em ação é a mesma motivação que sob
circunstâncias mais práticas conduziria à religião. Mesmo que se conclua negativamente
que precisa ser o ente e não antes o nada, porque “se fosse o nada, ninguém estaria
aqui para fazer essa pergunta” (Stephen Hawking), o interlocutor revela uma preocupação
filosófica de igual abrangência, ainda que para refutar a pergunta.
Da prática artística já vimos que o filósofo
extrai o caráter criativo e inevitavelmente metafórico de conceitos que internamente
designam os princípios que fundamentam seu discurso (como os de “ser”, “ideia”,
“coisa em si”, “absoluto”, “indizível”, o “pensamento” fregeano...), cuja construção
se deriva das mesmas intenções ampliacionais que encontramos nas práticas religiosas.
Além disso, há questões de estilo: o uso externo de metáforas, alegorias e aforismos,
de performances retóricas e mesmo da própria estrutura estetizante do discurso,
como se observa em Platão, em Spinoza e no Wittgenstein do Tractatus. Esses
elementos não apenas adornam o pensamento, mas também o moldam, revelando uma
dimensão estética que se entrelaça à busca filosófica pelo sentido da totalidade.
Considere agora as seguintes sentenças aforísticas:
Da luta dos opostos nasce
a mais bela harmonia. (Heráclito)
O tempo é a imagem móvel
da eternidade. (Platão)
A angústia é a disposição
fundamental que nos coloca diante do nada. (Heidegger)
Todo objeto amado é o
centro de um paraíso. (Novalis)
O que não pode ser dito
deve ser calado. (Wittgenstein).
Por
meio delas, o filósofo cede a recursos estéticos como veículos indutores de
reflexão. A linguagem, aqui, não se limita à função explicativa: torna-se
expressão poética do pensamento, revelando que o estilo é parte constitutiva da
filosofia. Metáforas, imagens e ritmos não apenas adornam o discurso — eles o
estruturam, ampliando sua capacidade de sugerir, provocar e iluminar.
Por fim, é da prática científica que o filósofo
extrai seu objetivo veritativo: a intenção de aproximar-se da verdade, valendo-se
de recursos metodológicos, formais ou empíricos, geralmente tomados de
empréstimo às ciências. Além disso, é essencial que o filósofo esteja ciente das
consequências da presente imagem científica do mundo, que deve ser
interpretada como uma extensão da imagem manifesta do mundo[6], esta
última sendo entendida como uma extensão do senso comum modesto (mooreano),
sem o qual não poderíamos sequer compreender a ciência e que é igualmente indispensável
para que o filósofo possa manter os pés sobre o chão do verossímil.
Considere,
por exemplo, afirmações como as seguintes:
O mundo é feito de
átomos e do vazio. (Demócrito)
Nada pode ser e não ser
ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto. (Aristóteles)
Ao pensar que existo,
não posso estar errado. (Descartes)
A indução só é possível
sob o suposto de alguma espécie de uniformidade do universo (Hume)
A ação que promove o
maior bem-estar para o maior número de pessoas é moral. (Bentham)
Os fatos no espaço lógico
são o mundo. (Wittgenstein)
Por meio
dessas sentenças vemos o filósofo empenhado em fundamentar seu discurso em verdades
acerca do mundo, o que aproxima a filosofia do saber compartilhado da ciência.
Quando consideramos a filosofia dos pré-socráticos,
todos esses três elementos, protocientífico, misticizante e estético, se encontram
muito fortemente presentes. O componente estético é evidente nos aforismos de Heráclito
e no poema de Parmênides. Heráclito escreveu em tom oracular, e o poema de
Parmênides (segundo Kenny, um mau poeta) é apresentado por uma deusa que, apontando
para as indevassáveis virtudes do ser, revela a influência totalizante do elemento
místico-religioso.
Além
disso, Heráclito, atento à constante mutabilidade do mundo sensível, buscava a sabedoria
no logos, nas leis ocultas da razão que governa o cosmo. Parmênides, por
sua vez, tinha por objeto o conhecimento do ser concebido como o imutável fundamento
da verdade.
Ambos,
embora frequentemente vistos como opostos, revelam-se mais próximos do que à primeira
vista se supunha. Aqui se torna evidente a motivação veritativa, voltada à
compreensão da verdadeira natureza das coisas, derivada da busca do consenso autêntico,
o traço mais distintivo da ciência.
VII
COROLÁRIOS E PERSPECTIVAS
The future eludes the imagination.
[O futuro escapa da imaginação.]
D. M.
Jesseph
Neste capítulo, proponho algumas aplicações dos esclarecimentos até aqui
apresentados acerca da natureza geral da filosofia tradicional. O objetivo é demonstrar
que essa abordagem possibilita uma diferenciação mais inteligível entre diferentes
maneiras de filosofar, além de oferecer uma nova interpretação da sucessão dos diversos
modos de se fazer filosofia, incluindo o modo linguístico-analítico.
1.
FORMAS DE FILOSOFIA
O triângulo metafilosófico discutido no capítulo anterior permite traçar,
ainda que de forma intuitiva, uma espécie de cartografia das formas filosóficas,
conforme o lugar que ocupam em seu interior. A analogia com a ópera volta a ser
pertinente. Ela é uma produção artística resultante da combinação de música, poesia
e enredo. Também nesse caso temos um triângulo, cujos elementos variam em proporção,
qualidade e grau de integração mútua:
MÚSICA
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ENREDO POESIA
No centro desse triângulo, integrando à perfeição cada um dos três elementos,
eu situaria a ópera Pagliacci, de Leoncavallo. Ela reconta um episódio
verídico no qual um palhaço, ao descobrir-se traído pela sua esposa, a Colombina,
assassina-a em plena apresentação, junto com amante que tentava salvá-la. Nesse
caso, o enredo dramático, a música e a poesia articulam-se à perfeição. Paggliacci
situa-se no centro do triângulo. Algo semelhante pode ser dito de Madame Butterfly,
de Puccini, cuja narrativa pungente se articula com momentos melodicamente incomparáveis.
Contudo, nem sempre é assim. Die Sauberflöte, de Mozart,
apresenta um enredo frágil, concebido para servir de suporte à música e à poesia,
que se revelam insuperáveis. Essa ópera posiciona-se afastada do vértice do
enredo, próxima à melodia e à poesia. O mesmo poderia ser dito de Die Dreigroschenoper,
cuja trama não chega a convencer, apesar do engajamento político de Brecht. Considere,
por fim, uma ópera dodecafônica como Wozzeck, de Alban Berg, melodicamente
pobre. Ela se afasta do vértice musical do triângulo, aproximando-se do lado que
une os vértices da poesia e do enredo.
Algo semelhante
ocorre com trabalhos filosóficos, que podem ser situados, comparativamente, no
espaço do triângulo formado por ciência, religião e arte, conforme o peso relativo
de suas dimensões veritativas, misticizantes e estetizantes. Considere o caso do
Tractatus Logico-Philosophicus, de Wittgenstein: por sua tentativa protocientífica
de construir uma teoria pictórica da representação, por sua doutrina mística do
indizível e por seus recursos estéticos, tanto estruturais quanto retóricos, essa
obra pode ser posicionada próxima ao centro do triângulo, ainda que
ligeiramente mais próxima do vértice científico, dado seu propósito de analisar
a linguagem da ciência. Quanto à segunda grande obra de Wittgenstein, as Investigações
filosóficas, ela parece situar-se mais distante do vértice científico e
mais próxima dos outros dois.
O exemplo mais expressivo de uma obra filosófica
que se aproxima do centro do triângulo é o dos diálogos platônicos. Platão já foi visto por muitos como o filósofo par
excellence,[7]
justamente por apresentar com vigor as três dimensões mencionadas, muito embora,
após a crítica de Nietzsche, pareça algo mais próximo do vértice místico. A
filosofia platônica apresenta uma dimensão veritativa, cognitiva e teórica própria
(nesse sentido protocientífica), evidenciada na natureza essencialmente argumentativa
de seus diálogos, em cujo centro – a doutrina das ideias – verdades ontológicas
são buscadas e justificadas em conexão com uma teoria sobre nossas capacidades cognitivas,
articulada a preocupações morais e sociais mais amplas. Contudo, a filosofia de
Platão revela também uma forte dimensão místico-totalizante, perceptível na invenção
da transcendência do reino das ideias e na tentativa de criar uma visão especulativa
abrangente sobre a formação do mundo. Essa dimensão se manifesta especialmente
no recurso aos mitos órficos, em sua doutrina da alma do mundo e na quase religiosa
veneração à ideia do bem. Há, por fim, o elemento estético, que confere a seus diálogos
o status de obras literárias de grande beleza e apelo duradouro. Ao equilibrar essas
três dimensões – veritativa, misticizante e estetizante – a obra platônica permanece
próxima ao centro do triângulo, exemplificando um esforço filosófico à beira da
perfeição, ainda que com um viés marcadamente místico.
Também próximo ao centro do
triângulo encontra-se Aristóteles, que mesmo com seu empirismo, jamais se afastou
por demais de suas raízes platônicas.[8] Outras
filosofias clássicas, como a de Descartes, também se aproximam,
umas mais, outras menos, desse ideal de integração de influências. Embora Aristóteles
e Kant se encontrem, na área central, o primeiro se encontra algo mais próximo do
vértice científico, dignificando especialmente a verdade, e o segundo algo mais
próximo do vértice místico, quando consideramos sua filosofia moral.
O papel
dessas diferentes dimensões raramente se distribui de forma tão equitativa. Existem
filosofias limítrofes, que podem ser situadas próximas a determinados lados ou vértices
do triângulo. A filosofia de Aristóteles, por suas motivações empiristas e realizações
como biólogo e lógico, está algo mais próxima do vértice científico do triângulo
do que a de Platão. Muitos filósofos analíticos influentes de língua alemã –
como em alguma medida Frege e em muito maior medida Rudolph Carnap – também se aproximaram
desse vértice. O mesmo vale para analíticos de língua inglesa com inspiração formalista,
direta ou indiretamente influenciados pela mentalidade dos positivistas
vienenses, como W. V. O. Quine, Donald Davidson, Saul Kripke, Hilary Putnam e
David Kaplan.
Mas a atração pelo vértice científico
não para aí: também pensadores de orientação comunicacional como J. L. Austin, P.
F. Strawson, John Searle e Paul Grice visavam aproximar-se do vértice científico,
além de um filósofo da mente influenciado pelo darwinismo como Daniel Dennett.
E o mesmo pode ser dito de um bom número de filósofos originais de língua inglesa,
como Bertrand Russell, e antes dele e representantes da tradição empirista como
John Locke e J. S. Mill.
Vejamos agora casos de
filósofos que se aproximaram do vértice místico-religioso do triângulo. Esse foi
o caso de Plotino, Agostinho, Scotus Eriugena e Tomás de Aquino, por suas motivações.
O mesmo pode ser dito de Spinoza, Fichte, Schelling e Hegel, o que justifica a abrangência
de suas filosofias. Filósofos ingleses como o bispo Berkeley, F. H. Bradley e
J. M. E. McTaggart, seguiram esse caminho.
Quanto aos pensadores algo mais próximos do vértice artístico, destacam-se
nomes como Heráclito e Nietzsche, que pode ser justamente classificado como um artista-filósofo.
Sua obra Assim falava Zaratustra foi considerado por Bertolt Brecht o maior
poema lírico da língua alemã (ainda que nesse ponto outros prefiram Goethe e Rilke).
Também savants como Montaigne, Pascal
e Cioran poderiam ser aqui destacados.
Há filósofos que se distanciam grandemente
do vértice científico e se aproximam do lado oposto do triângulo, aquele situado
entre a arte e a religião, como nos casos de Sören Kierkegaard, Martin Heidegger
e Jean Paul Sartre. Suas obras revelam, não só uma profunda preocupação existencial
e estética, mas também preocupações espirituais, religiosas ou não, muito distanciadas
das preocupações científicas.
Há, por
fim, os casos limítrofes: Novalis e Cioran para mim já transbordaram para o vértice
artístico. E a obra de Jacques Derrida, bem como a parte mais original da obra
de Gilles Deleuze, podem ser mais positivamente avaliadas como transbordando
para o território artístico. Esses casos podem ser distinguidos daqueles de artistas
trabalhando já fora das fronteiras filosóficas, embora em suas vizinhanças, como
Friedrich Hölderlin e, por vezes, Goethe.
Casos limítrofes, situados no vértice onde se inicia o pensamento religioso
incluem místicos como Jakob Böhme ou Meister Eckhart (os sermões religiosos de Eckhart
são impregnados de profundos insights antropológicos).
Há também, por certo, casos limítrofes
entre filosofia e ciência. Considere, por exemplo, a psicanálise de Sigmund Freud:
embora ainda dependa de interpretações subjetivas e não consensuais, é inegável
que suas técnicas possibilitam insights inéditos, dificilmente alcançáveis
pela psicologia introspeccionista que a precedeu – o que se deve, em grande
parte, ao ambiente controlado proporcionado pela prática psicanalítica. Outro exemplo
de trabalho nesse domínio fronteiriço pode ser encontrado nos escritos antropológicos
de Claude Lévi-Strauss: sua obra busca satisfazer uma ambição principalmente científica,
mas também estética.
2. TRÊS TRADIÇÕES FILOSÓFICAS
Podemos, enfim, classificar a totalidade dos movimentos filosóficos e mesmo
das tradições conforme seus respectivos posicionamentos no triângulo metafilosófico.
A filosofia anglófila tende historicamente a se aproximar do vértice
científico. A filosofia germanófila, do vértice místico-religioso; e a francófila,
do vértice estético. Um sociólogo veria tensões ideológicas operando na
distribuição dessas formas.
Entre as filosofias anglófilas
encontram-se a inglesa e a norte-americana. Comecemos com a filosofia inglesa.
Provavelmente pelos desenvolvimentos da ciência desde Isaac Newton e pelo desenvolvimento
técnico como o da máquina a vapor, a filosofia inglesa foi em geral voltada
para o vértice científico. Locke teve uma formação científica, trabalhando com o
químico Robert Boyle e formando-se em medicina. Sua obra dirigia-se ao vértice
científico, daí seu empirismo regido mais pelo bom senso o que pela lógica. Filósofos
como Thomas Reid, John Stuart Mill e Jeremy Bentham também evidenciaram
claramente essa orientação. No século XX Bertrand Russell foi uma figura única
como defensor da filosofia orientada em direção à ciência: o Principia
Mathematica foi uma tentativa frustrada de transformar a filosofia da
matemática em ciência como extensão da lógica. E o mesmo poderia ser dito sobre
P. F. Strawson e J. L. Austin. A teoria dos atos de fala desenvolvida por
Austin foi uma tentativa bem-sucedida de retirar uma teoria científica das
ações comunicativas do confuso campo filosófico.
Quanto à filosofia norte-americana, de C. S. Peirce
a W. V. O. Quine, ela foi sempre marcada pela influência da ciência. O
pragmatismo de filósofos como William James e John Dewey já expressava claramente
esse viés, ao propor a filosofia como instrumento para enfrentar os problemas concretos
da vida, orientando-se pela aplicação prática do saber científico. Essa
aproximação da ciência também se manteve entre filósofos analíticos americanos
posteriores de orientação analítica, como Saul Kripke, Keith Donnellan, Hilary
Putnam e David Kaplan, de inspiração formalista, além de Paul Grice e John Searle,
de inspiração empírica.
O respaldo da ciência contribui para explicar o
êxito de filosofias desafiadoras de inspiração formalista – como as de Kripke, Putnam
e Kaplan – em um mundo cada vez mais
orientado pelos resultados científicos. No entanto, esse alinhamento também
trouxe certas limitações que, combinando as reflexões de Susan Haack com as de Max
Weber, podemos descrever como resultantes de “desencantamentos prematuros do
mundo” (voreilige Entsauberungen der Welt). Trata-se do problema do cientismo:
a fixação em padrões científicos específicos como critérios exclusivos de valoração,
excluindo outros, o que pode ser útil como maneira de “dividir para conquistar”,
mas que, se levado ao extremo, conduz à fragmentação positivista do pensamento
e à perda de representações abrangentes, ou seja, à erosão da possibilidade de visões
mais amplas que possam conter os traços indispensáveis ao próprio progresso filosófico,
especialmente quando este se aproxima da ciência na forma de conhecimento autenticamente
consensualizável.
Consideremos agora a tradição germanófila. Desde
Meister Eckhart até Hegel, passando por Leibniz e Kant, a filosofia alemã
sempre revelou uma inclinação misticizante, voltada para o vértice
místico-religioso do triângulo metafilosófico, ainda que, em Nietzsche, sob a
forma de uma revolta ateia contra o cristianismo.
Alguns de seus expoentes, como Schelling,
Hegel e Heidegger, chegaram a estudar em seminários religiosos, o que revela o
entrelaçamento entre reflexão filosófica e inquietação espiritual. Historicamente, essa tradição filosófica carrega
um acento místico profundo, perceptível tanto na densidade elusiva de seu
discurso metafísico, quanto na busca pelos fundamentos últimos da realidade. Essa
vocação sistematizadora, que aspira à compreensão abrangente do mundo e da
mente, permanece viva, como se vê na obra de Jürgen Habermas, cuja produção
ainda ecoa o impulso totalizante da filosofia alemã, mesmo sob a égide da razão
comunicativa.
Vejamos, por fim, a tradição francófila. A
filosofia francesa tende a aproximar-se do vértice estético do triângulo. Já
havia uma inclinação literária nas Meditações de Descartes e nos ensaios
de Montaigne. Essa tradição se intensificou entre existencialistas como Sartre
e Merleau-Ponty, atingindo seu ápice na retórica pós-modernista de pensadores
como Michel Foucault, Gilles Deleuze e Jacques Derrida. Essa ênfase estetizante
encontra raízes na extraordinária tradição literária da língua francesa, que acabou
por impregnar o discurso filosófico de traços beletrísticos. Mas nesses últimos casos, não se trata de um
centramento na dimensão estética, como aconteceu, por exemplo, com os escritos
auto-irônicos de Emil Cioran, mas de uma centralidade estética aliada a uma
imitação insincera e retórica das demais dimensões da filosofia, que se torna
clara no caso de Derrida.
Assim como o excesso cientificidade perverteu
a filosofia anglófila, conduzindo-a ao cientismo e do cientismo à vacuidade, e
assim como o excesso místicizante conduziu às pseudo-profundidades do idealismo
alemão, a tradição francófila deixou-se contaminar pelo excesso de literatura.
O resultado final foi um jogo retórico-literário com escasso ou nenhum
compromisso veritativo, no interior do qual argumentos óbvios ou questionáveis foram
sugeridos de forma suficientemente obscura para que essas fragilidades não se
revelassem de imediato. A persistência nesse modo de proceder culminou numa persiflagem
retórica do trabalho filosófico genuíno. Tal como a criança que brinca com um
objeto fazendo de conta que é a coisa real, passou-se a simular a prática da
filosofia, como se bastasse encenar para que a filosofia se efetivasse.
Por isso, como já fiz notar, seria mais apropriado
que certos textos de Derrida fossem avaliados como instalações – obras de arte que
se valem de material filosófico. Mas então seriam obras menores, pois a boa obra
de arte, como R. G. Collingwood, em adição a Freud, percebeu, manifesta-se como
uma ilusão consciente capaz de regenerar nossa consciência, na medida em que revela
aquilo que uma sociedade procura esconder de si mesma. Já a “arte” de certos
filósofos pós-modernos, ao pretender, como filosofia, situar-se para além da ilusão
consciente, arrisca-se a servir mais à corrupção da consciência do que à sua regeneração,
uma vez que impede o leitor de progredir para além do jogo de faz-de-conta que por
ela fixado.[9]
Tão teoreticamente
trivial quanto nosso exercício cartográfico possa parecer, ele não deixa de impor
alguma ordem ao entulho das formas filosóficas. Além disso, contribui para tornar
mais plausível a aplicabilidade universal da explicação integrada aqui proposta.
De particular relevância é o desenvolvimento
histórico no interior do triângulo metafilosófico como sendo direcionado para seu
vértice científico que, como vimos, deve ser entendido como um empreendimento progressivista-consensualizador-objetivista
(cap. III). Assumindo o pressuposto da consiliência, a tendência geral é a de
que as investigações filosóficas, em suas áreas tradicionais, se aproximem de
modo oscilante e quase imperceptível, desse vértice científico. Ou seja, discussões
de início inteiramente aporéticas tendem, pouco a pouco, a estreitar suas
exigências argumentativas, impulsionadas por um reforço interteorético oriundo de
múltiplas direções, reforço este pré-justificado pela assunção da consiliência,
até se elevarem à condição de um conhecimento público legitimamente consensualizável.
Caso tal cenário se concretize, é de se esperar
que a filosofia, ao menos em seus domínios centrais, venha a desaparecer, restando
apenas formas menores de conjectura – algo comparável, ainda que com reservas,
ao que ocorreu com a ópera, substituída por expressões mais leves como operetas
e musicais. É possível que estejamos nos aproximando desse ponto. Nesse contexto,
assim como testemunhamos, outrora, poderemos assistir a morte da filosofia enquanto
empreendimento profundamente abrangente e aporético, tal como nos habituamos a
ver ao longo da tradição até tempos relativamente recentes.
O maior risco, porém, reside na tentativa de
apressar essa morte através de formas aparentemente assépticas de eutanásia,
como a fragmentação cientificista de áreas centrais da filosofia em obscuros guetos
de proficiente miséria intelectual – o que alguns receiam estar hoje acontecendo.[10]
3.
TRÊS PERÍODOS
HISTÓRICOS NA
EVOLUÇÃO DA FILOSOFIA
Como era de se esperar, as relações entre os elementos pós-religiosos e
protocientíficos mudaram com a emergência das ciências básicas. Em consequência,
todo o desenvolvimento histórico da filosofia ocidental pode ser interpretado à
luz das transformações ocorridas no vínculo dinâmico entre filosofia e ciência.
Essa constatação nos convida a dividir a história da filosofia em três grandes períodos,
definidos pela natureza dessa relação, que serão aqui denominados pré-formacional,
paraformacional e pós-formacional.
No princípio,
existiam somente religião e arte. Não havia ainda a ideia da ciência e, por
conseguinte, pouco ou nenhum espaço para a filosofia. O primeiro período do desenvolvimento
da filosofia ocidental teve início com os filósofos gregos pré-socráticos. Nós o
denominamos período pré-formacional, por anteceder à constituição das ciências
básicas como corpos sistemáticos de conhecimento.
Como já
discutido (cap. IV), o surgimento da filosofia grega não decorreu de uma insatisfação
com as explicações mitológicas, mas, sobretudo, da emergência de uma ideia de
ciência.[11]
O nascimento ainda fragmentário das primeiras teorizações científicas (em áreas
como aritmética, geometria, física e astronomia) levou os pensadores pré-socráticos
a formar, em suas mentes, uma ideia da ciência, tanto formal quanto empírica.
Segundo essa ideia, seria possível, com base em certos dados, formar generalizações
(como teoremas, leis) que, em abstração de suas aplicações práticas, permitiriam
justificar, explicar ou predizer fenômenos. Assim, a ciência surgia como um
instrumento capaz de revelar o que a natureza mantinha oculto – uma noção que
só viria a ser explicitada mais tarde, no Organon aristotélico.
É evidente que o novo modelo de pensamento,
introduzido pela ciência, foi a centelha que acendeu a chama da especulação filosófica
entre os pré-socráticos. Ele sugeriu à mente humana a magnífica possibilidade
de que o mundo inteiro – cuja natureza oculta até então era explicada apenas
pela religião – poderia ser compreendido por meio de generalizações abstratas.
Embora semelhante empreendimento fosse, à época, totalmente inviável como
realização factual, ele permanecia sempre possível como empreendimento especulativo.
Foi precisamente esse horizonte que os primeiros filósofos, também cientistas
ou, ao menos, intelectualmente familiarizados com o saber científico, buscaram explorar,
em plena consciência da fragilidade de suas conjecturas. Nesse processo, era
comum que misturassem, em maior ou menor medida, suas especulações com antigas explicações
de cunho antropomórfico. No entanto, como já vimos, o elemento antropomórfico
não se revelou sequer indispensável ao empreendimento filosófico.
Esse primeiro período de indagação
filosófica estendeu-se até o Renascimento. Ao longo de toda a Idade Média, embora
incorporando novos procedimentos dialéticos, a filosofia continuou sendo guiada
pela ideia – originalmente sugerida pela ciência – de explicar a natureza oculta
das coisas por meio de generalizações conceituais, sem necessidade de se
afirmar em um diálogo direto com o saber científico. Isso se deveu ao fato de
que a ciência, ainda incipiente e fragmentária, não possuía força suficiente para
desafiar as concepções ordinárias do mundo, as quais, somadas às ideias religiosas,
constituíam o pano de fundo garantido das reflexões filosóficas medievais.
A segunda fase da filosofia, denominada paraformacional,
caracterizou-se pela emergência e consolidação das ciências empíricas básicas –
a física, seguida da química, da biologia e das ciências humanas e sociais – enquanto
corpos sistemáticos de conhecimento. Esse movimento ocorreu em paralelo aos
avanços das ciências formais, abrangendo também os desenvolvimentos práticos indiretamente
relacionados a essas disciplinas (ver capítulo III).
No campo filosófico, esse período teve início
com Descartes e se estendeu, pelo menos, até Hegel. A partir de Descartes, a
filosofia passou a se desenvolver, em maior ou menor medida, como uma reação ao
avanço da ciência. Não é difícil perceber
que a tarefa da filosofia moderna não consistiu tanto em preparar o surgimento
de novos campos científicos, mas, sobretudo, em reformular e realocar o
material ideativo dos campos centrais remanescentes da filosofia, em conformidade
com novas ideias científicas, tanto formais quanto empíricas.
Tomando como exemplo a metafísica de Descartes,
é difícil acreditar que ele pudesse ter confiado na fecundidade do método geométrico
aplicado à filosofia sem antes ter testemunhado seu poder heurístico na
geometria analítica. Da mesma forma, é difícil ver como ele poderia sentir a necessidade
de responder ao cético se não estivesse familiarizado com o argumento da ilusão,
especialmente na sua formulação científica, ou com a descoberta de que o coração
não é a sede das paixões, como pensavam os antigos. Outro exemplo foi a suposta
revolução copernicana de Kant, marcada pela sugestão de que somos nós os legisladores
do universo. Essa ideia, tão audaciosa quanto improvável, só poderia ter surgido
como uma tentativa de acomodar nossos poderes cognitivos a um suposto conhecimento
absoluto da aplicabilidade (necessária e universal) da aritmética e da geometria
euclidiana ao mundo sensível, além de um suposto conhecimento absoluto da
aplicação (também necessária e universal) das leis do movimento e da gravitação
descobertas por Newton cerca de cem anos antes.
Chegamos, enfim, ao que pode ser considerado a fase pós-formacional do
desenvolvimento da filosofia, estabelecida após a emergência das ciências básicas.
Como vimos, essas ciências exigem uma certa ordem de desenvolvimento, que vai da
física à ciência social, já que é muito mais difícil imaginar uma ciência básica
mais complexa e particular surgindo antes de uma mais simples e geral. Atualmente,
uma variedade de desenvolvimentos científicos locais vem emergindo, o que
requer a existência prévia de ciências básicas, já que esses avanços se apoiam diretamente
nelas. Muito da filosofia contemporânea é (ou deveria ser) uma resposta à
emergência desses desenvolvimentos, nascida da necessidade de revisar nossas concepções
filosóficas remanescentes de modo a torná-las mais coerentes com as perspectivas
que esses avanços científicos vêm instaurando.
1.
A FILOSOFIA
ANALÍTICA
NAS RODAS DA HISTÓRIA
A consideração da fase mais recente do desenvolvimento da filosofia, sob
a perspectiva aqui adotada, ajuda a compreender por que, no século XX, ela
chegou a ser equivocadamente considerada uma atividade essencialmente voltada à
análise conceitual. Uma das razões para essa concepção residiria no fato de que,
com o avanço das ciências empíricas básicas, estas passaram a ocupar o espaço
anteriormente ocupado pela filosofia como especulação empírica antecipadora das
ciências empíricas particulares. Uma consequência é que a filosofia passou a se
restringir a especulações de ordem superior, mais reflexivas, por exemplo, a
investigação metafísica da referência de conceitos que fazem parte do vocabulário
epistêmico comum a qualquer ciência básica, como os de verdade, conhecimento,
crença, etc., sem falar em conceitos metafísicos como propriedade, substância,
número, existência, evento, processo… bem como suas possíveis relações, distanciando-se
assim de preocupações empíricas imediatas.
Entretanto, a consolidação da filosofia
dita linguístico-analítica deveu-se, em grande parte, à tomada de consciência de
novos mecanismos de controle dos procedimentos argumentativos, os quais exigem uma
organização mais explícita dos componentes lógico-conceituais do discurso. Essa
exigência frequentemente requer ascensão semântica, ou seja, um tratamento daquilo
que dizemos através de uma metalinguagem semântica. Sob tais circunstâncias, tornou-se
fácil confundir a filosofia, em sua natureza própria, com um simples esforço de
esclarecimento linguístico-conceitual.
Contudo, tanto o distanciamento da especulação
filosófica de preocupações com questões de ordem empírica imediata quanto a ênfase
nos aspectos linguístico-conceituais, são apenas momentos contingentes de uma trajetória
histórica. Dizer que a filosofia do século XX foi, em boa parte, uma indagação
linguístico-conceitual é apenas descrever a forma assumida pela filosofia em
determinado período histórico, especialmente no contexto anglófona, e de modo
algum diagnosticar sua natureza essencial.
Adotando essa perspectiva, tornamo-nos melhor posicionados
para compreender os desenvolvimentos internos da filosofia linguístico-analítica.
Retomando as considerações iniciais, podemos entender que as principais
conquistas desse desenvolvimento filosófico estão intrinsecamente ligadas ao
desenvolvimento e à consolidação de uma constelação de teorias científicas que pertencem
ao âmbito da semiótica, no sentido mais amplo possível do termo. A
filosofia analítica se vincula à semiótica, por um lado, pelo caráter conjectural
que tem marcado a exploração gradual desse domínio (por exemplo, pela ambiciosa
pragmática universal de Jürgen Habermas); por outro, pela necessidade incontornável
de realocar e reformular nossas concepções acerca dos problemas filosóficos tradicionais
em resposta aos avanços ocorridos no campo da semiótica, o que inclui, por
exemplo, o uso da lógica modal por Saul Kripke em sua teoria da referência.
Um ponto fundamental já
abordado no capítulo II é a existência de uma ordem de pressuposições entre os três
domínios da semiótica: de modo geral, a semântica pressupõe a sintática,
e a pragmática pressupõe ambas – sintática e semântica. Essa hierarquia
torna-se evidente ao considerarmos que é possível aprender a sintaxe de uma linguagem
não interpretada, abstraindo-se dos significados dos signos, de sua semântica e,
certamente, de sua pragmática comunicacional. Contudo, dificilmente se pode aprender
as relações referenciais de uma linguagem, seja dos signos isolados, seja das combinações
de signos, seja dos próprios signos isolados quando polissêmicos, sem antes identificar
suas unidades sintaticamente estruturadas.
Afora isso, é possível avançar muito no aprendizado
da sintaxe e da semântica em abstração do contexto, isto é, sem levar em conta
o uso da linguagem nas circunstâncias concretas da comunicação humana, ou seja,
sua dimensão pragmática. Todavia, não se pode aprender a aplicar as regras pragmáticas,
isto é, avançar no aprendizado do uso dos signos em proferimentos concretos, quando
não sabemos identificar as suas possíveis articulações sintáticas e suas referências.
Uma implicação dessa sequência de pressuposições
é que é natural supor que o desenvolvimento histórico do conhecimento semiótico
siga a mesma ordem dessas pressuposições, começando com a sintática, prosseguindo
com a semântica e culminando na pragmática.[12]
As reflexões
acima contribuem para nos fazer entender o desenvolvimento histórico da filosofia
analítica ao longo do século XX. A filosofia analítica emergiu em três ondas sucessivas
de investigação. No final do século XIX, Gottlob Frege foi o primeiro a desenvolver
uma formulação simbólica completa do cálculo dos predicados, integrada ao
cálculo sentencial. Essa foi uma contribuição essencialmente sintática de importância
sem precedentes para o desenvolvimento da lógica, embora também contivesse uma
forma esquematizada de semântica. Não seria um grande exagero afirmar que a lógica,
enquanto ciência, realmente começou com Frege.
O atomismo lógico de Bertrand Russell e o do primeiro
Wittgenstein no Tractatus Logico-Philosophicus podem ser vistos como as
principais tentativas de integrar questões da filosofia do conteúdo e da teoria
do conhecimento aos avanços revolucionários da lógica simbólica. Embora houvesse desenvolvimentos semânticos,
como a distinção entre teoria do sentido e da referência, a teoria referencialista
do significado do Tractatus, bem como as especulações de Russell sobre
os designata dos nomes propriamente lógicos – esses elementos ainda desempenhavam
um papel complementar e, em grande parte, quase esquemático.
A segunda onda foi principalmente semântica: Wittgenstein,
na fase intermediária de seu desenvolvimento filosófico, sugeriu um princípio
da verificação que associava a proposição ao fato que a verifica. Assim, desde
1929, continuando pelo menos até as aulas de 1934-5, ele sugeriu que o sentido
cognitivo (o conteúdo proposicional expresso por uma sentença declarativa) deve
ser dado por um feixe de modos de verificação com pesos semânticos diversos.
Assim, se alguém diz “Cambridge venceu a corrida de botes”, ver o bote vencer,
ouvir o apito do juiz, ouvir isso de alguém, ler em um jornal, ver o troféu no clube...
são maneiras diversas de verificar, constituindo essas maneiras o sentido da
frase declarativa ou, se quiserem, a proposição por ela expressa. Por fim, como
ele notou, se tirarmos um a um esses modos de verificação, enfraqueceremos o
significado da frase e, se tirarmos todos os modos de verificação, nada mais
restará de seu sentido.[13] Essa
ideia demanda uma investigação pragmática que, tanto quanto sei, nunca foi desenvolvida.
A terceira onda trouxe em sua crista os esforços
dirigidos à criação de uma ciência da pragmática e à acomodação de problemas filosóficos
à luz de seus resultados. Ela começou com as reflexões dispersas do último Wittgenstein
sobre as múltiplas funções da linguagem, nas quais o significado das expressões
passou a ser identificado com seu uso em contextos específicos de jogos de linguagem.
A consolidação da pragmática
como campo sistemático de investigações sobre as ações comunicativas deveu-se
sobretudo aos trabalhos de J. L. Austin em sua teoria dos atos de fala, além do
trabalho complementar de John Searle e de contribuições independentes como a das
implicaturas conversacionais de Paul Grice.
Investigações da pragmática também conduziram
a tentativas de acomodar velhos problemas filosóficos aos novos aportes teóricos.
Um exemplo inicial disso foi a reestruturação e relocação do problema mente-corpo
– mesmo que em uma forma ultimamente desencaminhada – como um resultado de reflexões
pragmáticas sobre um necessário momento interpessoal no aprendizado da linguagem.
Parte desse esforço pode ser observada no trabalho do último Wittgenstein (que,
segundo Strawson, tinha um preconceito contra a subjetividade), em sua tentativa
de escapar da consequência paradoxal do argumento da linguagem privada pela rejeição
de nossa linguagem mentalista, a ser substituída por uma problemática doutrina da
“expressão criterial”. Assim, a expressão “Ai!” seria substituída por “Dói”,
que acabaria sendo substituída pelo proferimento por “Sinto dores”, sem a
necessidade de uma referência à sensação interna de dor.
Outro esforço reformulador de problemas filosóficos,
emergindo como uma aplicação de desenvolvimentos pragmáticos (especialmente, embora
não inteiramente, da teoria dos atos de fala) foi encontrado na pragmática universal
de Jürgen Habermas, uma complexa teoria cuja função última seria a de demonstrar
como é possível ler estruturas sociais e suas possíveis distorções nos modos de
funcionamento de nossas ações comunicativas. Uma vez mais, vemos o papel da ênfase
linguístico-conceitual como uma característica relevante, ainda que historicamente
contingente e não essencial à filosofia enquanto tal.
2.
O FUTURO DA
FILOSOFIA: PERSPECTIVAS E LIMITES
O que pode ser esperado para o futuro? A explicação socio-histórica da natureza da filosofia
esboçada nesse livro oferece-nos alguns indícios para pensar o futuro da filosofia.
Pelo próprio fato de se tratar de uma atividade cultural derivada, não há
garantia de estabilidade ou permanência.
Voltando à analogia com a ópera,
esta se desenvolveu paralelamente à música polifônica após o Renascimento, atingindo
seu auge nos séculos XVIII e XIX, apenas para perder quase toda a sua relevância
no século XX, sobrevivendo apenas sob formas menores, como as da opereta e do musical.
Mas o caso da filosofia é diferente do da ópera no seguinte sentido: tendo
nascido da mitologia e dirigindo-se ao consenso científico, ela poderá, ao
menos em seus domínios mais centrais, acabar sendo substituída pela ciência.
Contudo,
em suas áreas centrais, a filosofia pode bem ter o destino da ópera. Pois os melhores
tempos já se foram. Eles pertenceram originalmente aos grandes sistemas de Platão
e Aristóteles, e, na modernidade, ao período de configuração das ciências básicas,
quando a filosofia, em um percurso que começou com Descartes e culminou com a obra
de Kant, como já foi notado, buscou acomodar suas concepções filosóficas remanescentes
às transformações geradas pelo surgimento dessas ciências e pela nova visão de mundo
delas derivada. Hoje a investigação filosófica, em grande parte confinada a
subquestões que emergem de núcleos de questionamento remanescentes ou
limítrofes, parece avançar em formas menores.
Contudo, é bom não esquecer
que esse diagnóstico não implica, necessariamente, juízo de valor. A filosofia
contemporânea pode ainda ser relevante. Afinal, a Ópera dos Três Vinténs,
embora em menor forma, não parece menos importante do que O Crepúsculo dos
Deuses, ao menos para aqueles que se recusam a se deixar impressionar pelo pathos
wagneriano. O mesmo pode ser dito se compararmos Appearance and Realidade,
do hegeliano F. H. Bradley com Naming and Necessity, de Saul Kripke, um
texto de menor escopo, mas profundo e desafiador.
É óbvio que podemos esperar que, em algum momento
futuro, as atuais filosofias da ciência evoluam para se tornarem metaciências, à
medida que nos aproximarmos de um consenso sólido sobre a veracidade de suas
explicações sobre a natureza de seus objetos.
Mas nossas maiores expectativas continuam
voltadas para o núcleo central de problemas filosóficos tradicionais, que em geral
permanecem `a margem de qualquer consenso. Os domínios de especulação mais difíceis
e complexos da epistemologia, da metafísica e da ética são amplamente abrangentes:
a epistemologia por aplicar-se a nosso acesso cognitivo a qualquer coisa; a metafísica
por ter de explicar, independentemente das ciências particulares que utilizam
seus conceitos, as categorias últimas da realidade (como propriedade, substância,
existência, causalidade, identidade, a parte e o todo...), que atravessam não somente
as múltiplas formas de conhecimento científico, como também todo nosso saber comum.
Embora não tão abrangente, a ética tem se mostrado profundamente integrada ao cerne
da atividade social humana; consequentemente, também requer uma abordagem argumentativa
e conjectural.
É verdade que, embora a ciência tenha tomado lugar de muito do que antes
era filosofia, ela continua incapaz de ocupar o espaço dos domínios centrais da
tradição filosófica. Contudo, se adotarmos a concepção tolerante da ciência como
conhecimento público consensualizável, parece não haver razões para negar que,
em princípio, em algum momento no futuro, a ciência possa absorvê-los. Mas,
nesse caso, não irá fazê-lo reduzindo-a ao que já é reconhecido como ciência, como
pretende o cientismo, mas reinterpretando suas representações panorâmicas (übersichtliche
Darstellungen) sob o suposto da consiliência, de tal forma que mesmo esses domínios
centrais se tornem capazes de obter consenso legítimo acerca de seus resultados
e, por conseguinte, se tornem ciência.
Tenho aqui meus palpites. No que
concerne à epistemologia, tudo o que precisamos fazer é livrar-nos da nuvem de poeira
confusiva produzida por desafios enganosos como o argumento de Gettier e um externalismo
epistêmico manqué, que nos impede de enxergar nosso objeto claramente,
de modo a termos acesso livre ao seu núcleo central.[14] No
que concerne à metafísica, o que precisamos é colocar o platonismo de cabeça
para baixo, começando pelo tratamento dos tropos de Donald Williams[15] como
as pedrinhas ontológicas de construção do universo – um programa que nunca foi
realmente desenvolvido. E quanto à ética, o que precisamos é desenvolver um
consequencialismo de duas camadas, semelhante ao proposto por R. M. Hare[16],
segundo o qual normalmente seguimos um utilitarismo de regras, enquanto em
casos nos quais não há regras ou em que a dor causada é muito superior à manutenção
do sistema de regras, somos forçados a um utilitarismo de ação do tipo
benthamiano. O desenvolvimento de qualquer um desses palpites demandaria um
imenso trabalho de investigação sistemática e não a filosofia fragmentada “da
mão para a boca” que hoje é moda.
O esclarecimento da natureza da filosofia como
uma atividade cultural derivada de três atividades culturais fundamentais contribui
para explicar o sentido da palavra ‘filosofia’, tal como ela tem sido aplicada ao
centro de gravidade da tradição ocidental. No entanto, esse esclarecimento tem muito
pouco, ou nada, a ver com as subáreas periféricas que hoje parecem multiplicar-se.
Elas pertencem a um sentido derivado do termo ‘filosofia’, que preserva apenas
o elemento de conjectura veritativamente direcionada, mas é incapaz de alcançar
consenso legítimo.
Mesmo se entendermos por filosofia no sentido estendido, como tudo o que
escapa à consensualização pública legítima, a ideia de sua completa transformação
em ciência parece improvável. Basta observar que quando novos domínios do conhecimento
emergem, a tendência é o aparecimento de uma filosofia desse domínio, não só
como a filosofia da física e da psicologia, mas também a filosofia da tecnologia,
a filosofia da medicina, a filosofia da informação, a filosofia ambiental, a filosofia
pós-colonial, a filosofia da sexualidade e do gênero... Isso, sem falar nas
filosofias do processo, cujos resultados dependem do que acontecerá no futuro.
Não obstante, considerando que tudo o que experienciamos
até agora tem se revelado como uma sequência de subdivisões e recombinações oriundas
das ciências básicas, não parece implausível supor que exista um limite à aquisição
de novo conhecimento científico essencial. Se esse for o caso, torna-se concebível
imaginar um tempo futuro em que filósofos e cientistas venham a se encontrar
desempregados, sentados lado a lado, em um mundo intelectualmente saciado, onde
tudo o que vale a pena conhecer já terá sido investigado e em que nenhuma descoberta
relevante reste a fazer. Nesse cenário hipotético, não
haverá mais espaço para acomodar o que resta de nossa visão filosófica em
relação à ciência, uma vez que não haverá mais nenhum “resto” a ser integrado.
A cosmovisão será então composta pela soma do conhecimento científico com o conhecimento
do senso comum humilde, nada mais sendo admitido. A busca por uma totalidade que
transcenda esse arcabouço será então reconhecida como um empreendimento desnecessário
e sem sentido.
Diante
de tantas incertezas, insisto apenas em um ponto: as problemáticas centrais da
tradição filosófica não poderão ser substituídas por uma multiplicidade de mini-teorias
pseudocientíficas, hiperespecializadas, desconectadas entre si e pouco inspiradoras,
como sugere a fragmentação positivista-cientificista do campo da experiência
que hoje enxameia a dita filosofia analítica. A liberalidade e a flexibilidade
de nosso conceito de ciência, aliadas à noção de consiliência aplicada à articulação
entre as questões filosóficas centrais e quaisquer outras, indicam a
possibilidade de que realizações consensuais se tornem suficientemente refinadas
e abrangentes e assumam seu lugar como ciência, preservando, dessa maneira, o suspeitado
valor das indagações que as motivaram.
Na
filosofia acadêmica atual, a estratégia de dividir para conquistar foi muito além
de seus limites. O ideal é conquistar sem precisar dividir. No entanto, como o
campo se encontra minado por hipóteses curiosas de toda ordem, o trabalho de
desminagem só será possível quando se tornar claro que as minas o tornaram
completamente infértil.
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[1] Ver Wittgenstein, Philosophische Untersuchungen, I,
sec. 122. A passagem é central porque explica o papel do entrelaçado de conceitos
teóricos como ‘uso’, ‘jogo de linguagem’, ‘gramática’, ‘forma de vida’... presentes
na filosofia do último Wittgenstein. Ideias aparentadas já haviam sido antecipadas,
por exemplo, por C. D. Broad, que em 1923, no capítulo 1 de Scientific Thought,
já preconizava uma análise sinóptica clarificadora de nossos conceitos centrais
e de suas relações como uma maneira de bloquear um entendimento distorcido da realidade
resultante de nosso “wishful thinking”. Mas Wittgenstein foi único ao apresentar
uma verdadeira representação panorâmica da linguagem por meio de sua filosofia.
[2] Exemplos foram filósofos franceses como Jean-François
Lyotard, Michel Foucault e Jacques Derrida, sem falar do americano Richard Rorty.
Se eles pretendiam que a verdade é sempre uma construção social relativa, isso
é bastante questionável. Mas, se eles apenas pretendiam que não podemos aceder
a uma verdade absoluta, objetiva e universal, estavam apenas reafirmando o que
a maioria dos filósofos contemporâneos desde C. S. Peirce e Karl Popper considera
um lugar-comum.
[3] Ver o conhecido manifesto positivista de Moritz Schlick,
Hans Hahn, Otto Neurath intitulado The Scientific Conception of the World: The
Vienna Circle (1929).
[4] Benoît Petters, Derrida, p. 647. O juízo de Anthony Kenny
sobre esse faz-de-conta retórico do verdadeiro labor filosófico é certeiro: “Não
surpreende que sua fama tenha sido menor em departamentos de filosofia do que em
departamentos de literatura, cujos membros tem tido menor prática em distinguir
filosofia genuína de filosofia falsificada.” A New History of Western Philosophy, vol. IV, p. 96.
[5] Em 1929 os membros do Círculo de Viena visitavam
Wittgenstein para
que ele lhes explicasse o Tractatus, o que ele fez com certo
contragosto. Uma vez, para horror de seus visitantes, defendeu um metafísico,
supostamente Schopenhauer, que ele havia lido com prazer. Noutra, recebeu-os
sentado de costas, lendo em voz alta as poesias de Rabindranath Tagore. Combinou
com o Círculo ditar um livro expondo sua nova filosofia para um de seus membros,
Frederich Weismann. Moritz Schlick era seu amigo. Com a morte de Schlick em 1936,
ele se viu desobrigado dessa tarefa, rompendo definitivamente com o Círculo. No
Blue Book (1933-1934) ditado a seus alunos em Cambridge em 1933-1934 ele
expôs com clareza sua crítica ao cientismo positivista: “Filósofos constantemente
veem o método da ciência diante de seus olhos e são irresistivelmente tentados
a se fazer questões do modo como os cientistas fazem. Essa tendência é a fonte
real da metafísica e deixa o filósofo em completa escuridão”, p. 18.
[6] “Philosophy and the Scientific Image of Man”. In. R. G.
Colodni, Frontiers of Science and Philosophy, University of Pittsburg Press,
1962.
[7] É famosa a exagerada frase de A. N. Whitehead: “Toda a
filosofia ocidental nada mais é do que notas de rodapé à filosofia de Platão”.
[8] Ver W. K. C. Guthrie, A History of Greek Philosophy, vol.
VI, cap. XIII.
[9] Em seu livro The Principles of Art, Collingwood distinguiu o que
chamou de arte própria (verdadeira) do mero entretenimento. A arte própria é
expressão capaz de regenerar a consciência por ser capaz de trazer à tona aquilo
que uma sociedade reprime e ignora, mas que por uma questão de sobrevivência
precisa reconhecer.
[10] Cf. Susan Haack: “The Fragmentation of Philosophy: The Road to its Reintegration”.
Susan Haack: “Scientistic Philosophy: No; Scientific Philosophy: Yes”.
[11] Pode-se perguntar aqui como seria o caso das filosofias
orientais. Tal caso mereceria um estudo à parte. Ao que parece, esses povos estavam
inicialmente menos próximos de uma ideia da ciência do que os gregos. Mas é sintomático
o fato de a filosofia indiana nunca ter se distinguido suficientemente da religião;
ou o fato de a filosofia chinesa ser centrada em questões humanas e sociais práticas.
Foi por isso que Hegel as pensou como não sendo propriamente filosofias, mas sabedorias,
posto que, em seu modo de ver, insuficientemente argumentativas.
[12] Uma outra implicação da mesma sequência de pressuposições
já foi notada no
capítulo II com relação aos estilos filosóficos: o filósofo formalmente orientado
(ex: Saul Kripke) tem muito mais liberdade para contrariar o senso comum. Já o
filósofo pragmaticamente orientado (ex: John Searle) precisa tê-lo em consideração,
com a possível vantagem de que suas ideias sejam mais fortes no sentido de serem,
à primeira vista, mais plausíveis.
[13] Wittgenstein, Ludwig
(2001): Wittgenstein’s Lectures: Cambridge 1932–1935, p. 29. Os positivistas lógicos fizeram
uma interpretação formalista simplista do conceito de verificação proposto por
Wittgenstein, só para descobrir que estavam errados, o que conduziu à enganosa sabedoria
herdada de que o princípio é falso. O que o problema exige é uma investigação
pragmática sistemática. Ver Claudio Costa, “Verificationism Redeemed”, in Philosophical
Semantics, cap. V.
[14] Claudio Costa: “A Perspectival Definition of Knowledge”
[15] On the Elements of Being I e II. The
Review of Metaphysics.
[16] Moral Thinking, its Levels, Methods, and Point.



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