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If you wish to be acquainted with my groundbreaking work in philosophy, take a look at this blogg. It is the biggest, the broadest, the deepest. It is so deep that I guess that the narrowed focus of your mind eyes will prevent you to see its full deepness.

terça-feira, 14 de outubro de 2025

SOBRE A NATUREZA DA FILOSOFIA

 Draft f4

 

 

 

 

 

SOBRE A NATUREZA DA FILOSOFIA

 

POR UMA TEORIA ABRANGENTE

 

 

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ἡ Σίβυλλα μαίνεσθαι φθέγξεται ἀστολιστὶ καὶ ἀκαλλώπιστα καὶ ἀμύριστα, διαπεραίνουσα χιλίων ἐτῶν φωνῇ διὰ τοῦ θεοῦ.*

   Heráclito

 

Nun scheint mir, gibt es ausser der Arbeit  des Kunstlers  noch  eine  andere,  die   Welt   sub specie aeterni einzufangen. Es ist – glaube ich, der Weg des Gedankens,  der  gleichsam  über die Welt hinfliege und sie so lässt,  wie sie  ist – sie von oben von Fluge betrachtend.**

                                            Ludwig Wittgenstein

                                               

Science is what we know; philosophy is what we don’t know. (…) Science is what we can prove to be true; philosophy is what we can’t prove to be false.***

                                            Bertrand Russell

 

The gem is of purest ray serene, but it is condemned to remain in the dark, unfathom’d caves of ocean; the flower has its swetness, although it is wasted in the desert air.****

   Robert Merton

 

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* A sibila com boca raivosa proferindo palavras sem riso, sem adorno e sem incenso, alcança mais de mil anos pelo deus que nela habita.                 

** Assim parece que junto ao trabalho do artista há ainda outro, que é o de capturar o mundo sub specie aeterni. É – eu creio, o caminho do pensamento que, por assim dizer, voa sobre o mundo deixando-o como está – visto de cima, de seu voo.

*** Ciência é o que conhecemos; filosofia é o que não conhecemos. (...) Ciência é o que podemos provar que é verdadeiro; filosofia é o que não podemos provar que é falso.

**** A joia é de raio sereno e puríssimo, mas está condenada a permanecer nas cavernas escuras e insondáveis do oceano; a flor tem sua doçura, embora se perca no ar do deserto.

 

 

 

 

 

 

                                                 SUMÁRIO

 

 

 

                PREFÁCIO

 

                APRESENTAÇÃO

 

I.                   INTRODUÇÃO: OBJETIVOS E METODOLOGIA

1. Observações Metodológicas

 

II.                FILOSOFIA COMO ANÁLISE CONCEITUAL

1.     Os atalhos da crítica da linguagem

2.     Filosofia como análise da linguagem

3.     A falácia objetal na filosofia analítica

4.     Para concluir: um paralelo com o Organon aristotélico

 

III.             FILOSOFIA COMO ANTECIPAÇÃO CONJECTURAL DA CIÊNCIA

1.     O caráter inevitavelmente conjectural da indagação filosófica

2.     A ideia da filosofia como protociência

3.     Origens e divisões da ciência

4.     Alguns exemplos de insights filosóficos protocientíficos

5.     Fissão

6.     O núcleo resistente de problemas filosóficos residuais: duas hipóteses

7.     Nossa ideia geral da ciência

8.     Por uma concepção não-restritiva de ciência

9.     Por que conceber a filosofia como um empreendimento protocientífico?

10. Consequências da concepção proposta

 

IV.            RELIGIÃO E OS REMANESCENTES MÍSTICOS DA FILOSOFIA

1.     Filosofia e religião: a abordagem genética

2.     A lei comtiana dos três estágios

3.     Uma breve avaliação da lei de Comte

4.     Filosofia como uma indagação transitória entre religião e ciência

5.     Conclusões

 

V.               A RELAÇÃO ENTRE FILOSOFIA E ARTE

1.     O sabor artístico de alguns escritos filosóficos: similaridades externas

2.     Similaridades internas entre filosofia e arte

 

VI.            PARA UMA EXPLICAÇÃO ABRANGENTE: INTEGRANDO

          AS CONFIGURAÇÕES CRITERIAIS

1.     Filosofia como uma atividade cultural derivada

2.     Uma explicação integradora da atividade filosófica

 

VII.         COROLÁRIOS E PROSPECTOS

1.     Formas da Filosofia

2.     Três fases históricas na evolução da filosofia

3.     A filosofia linguístico-analítica nas rodas da história

4.     O futuro da filosofia

 

 

     BIBLIOGRAFIA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                              PREFÁCIO

 

 

 

Em 2002 publiquei um pequeno livro chamado The Philosophical Inquiry: Towards a Global Account (UPA 2002). Escrevi-o enquanto pesquisador visitante sob os auspícios da CAPES na Universidade de Berkeley em 1999, enquanto assistia aos formidáveis cursos de John Searle.

   Apesar da avaliação bastante positiva por parte da editora, o livro foi um dentre os vários natimortos que desde então publiquei em inglês e que não receberam resenha alguma. Recolhido em um autoimposto exílio no acolhedor Nordeste do Brasil, numa tentativa de me proteger de dissonâncias cognitivas que comprometessem minha liberdade intelectual, eu ignorava, à época, que as grandes editoras anglo-americanas mantêm o monopólio de um mercado majoritariamente formado pelas bibliotecas universitárias, mesmo que sob o risco de incorrer em um possível círculo vicioso. Para agravar a situação, essas editoras sempre se negaram a avaliar manuscritos de um completo outsider socialmente disléxico. Afinal, quem levaria a sério um livro escrito por um estrangeiro desconhecido, sem falar de ocultos interesses corporativistas?

    Em 2005 decidi fazer uma tradução para o português do mesmo livro, publicando-o pela editora de minha universidade, a UFRN. O que não sabia é que a editora não fazia distribuição. Ou seja: ainda hoje você poderá encontrar os exemplares guardados no depósito!

   Mas sou persistente e aprecio meu trabalho, razão pela qual é nele que encontro minha maior recompensa. Esta nova edição, com um título mais apropriado, contém uma versão completamente revisada e ampliada do texto original.

     Há pessoas às quais devo sincera gratidão por terem contribuído no sentido de fixar meus valores intelectuais, sem os quais minhas ideias metafilosóficas talvez nunca tivessem ganhado forma. Meus professores, Raul Landim e Guido Antônio de Almeida, junto com meus ex-colegas Fernando Fleck e Fernando Rodrigues, foram os primeiros a me fazer enxergar a importância da tradição filosófica. Ernst Tugendhat me influenciou pela sua defesa intransigente de uma visão unificada do que deve ser o trabalho filosófico. John Searle, que me recebeu em Berkeley quando escrevi a primeira versão desse livro, foi em seus cursos um exemplo vivo de como se pode realizar um trabalho criativo em filosofia sem sacrificar o senso de humor, o que é ainda mais raro. Agradecimentos especiais ao professor Peter Stemmer, que me recebeu em Konstanz no turbulento ano sabático de 2022, e ao professor Francesco Orilla, que nessa mesma época gentilmente me convidou a expor minhas ideias sobre metafilosofia na Universidade de Macerata. Gostaria também de agradecer o apoio dos professores e amigos Cinara Nahra e Eduardo Maciel pelo seu apoio cultural e humano. Acima de tudo, agradeço à Rita Cristina Fressa, a quem devo mais do que seria capaz de reconhecer.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

APRESENTAÇÃO

 

Desejo iniciar fazendo um breve resumo da ideia central contida nesse livro, de modo que seu eventual leitor possa perceber o fio condutor em meio a um texto repetitivo e marcado por digressões. Meu objetivo principal foi esboçar uma teoria metafilosófica da natureza da filosofia, mais sistemática, mais complexa e, em meu juízo, superior a eventuais concorrentes.

     Esse trabalho de teorização se desenvolveu como uma tentativa de esclarecer o lugar cultural dos problemas centrais legados pela tradição, mas também se estende parcialmente a outras formas quaisquer de indagação filosófica. Tal abrangência só se tornou possível por se tratar de uma teoria feita sob uma perspectiva externa a essas formas, permitindo um olhar histórico-cultural mais amplo do que aquele oferecido por qualquer filosofia específica. A ideia geral que apresentarei a seguir não é inédita, mas o que importa é sua exploração. Afinal, ter um caso suficientemente duradouro e aprofundado com uma ideia não é o mesmo que ter tido um encontro meramente casual com ela.

   A teoria que proponho nesse livro nasceu de uma investigação das conexões entre a filosofia e três atividades culturais mais fundamentais, que são as da ciência, da religião e da arte. Ao considerar essas relações, a filosofia é concebida como uma atividade cultural derivada – uma amálgama de elementos originalmente presentes no compromisso com a busca da verdade que se espera do pensamento científico, no ímpeto holístico que dá lugar à religião e nos recursos metafóricos próprios da arte.

   Talvez o exemplo mais emblemático dessa amálgama seja a filosofia de Platão. Em sua obra, revela-se uma dimensão de busca da verdade, em um esforço que vem expresso nos argumentos que buscam explicar como compreendemos o mundo, incluindo momentos de severa autocrítica, como acontece na primeira parte do diálogo Parmênides. Também em Platão encontramos uma dimensão místico-totalizante, manifesta em seu aceite de um reino transcendente das ideias e no apelo aos mitos órficos. Por fim, sua filosofia apresenta um forte elemento estético, evidente na estrutura dramática dos diálogos, no estilo refinado, na ironia, nas alegorias e nos mitos que permeiam sua escrita.

     Como estratégia, semelhanças e diferenças entre a filosofia e outras formas de atividade cultural foram investigadas. Em sua proximidade com a ciência, a filosofia revelou-se um esforço heurístico direcionado à aproximação da verdade e a resultados efetivos, ainda que por sua própria natureza jamais alcance uma forma plena.

   Em sua relação com a religião, ela mostrou-se inclinada a expandir ao máximo a profundidade e a abrangência de suas sínteses, incorporando elementos especulativos que inevitavelmente extrapolam os limites da investigação racional.

   Por fim, em sua afinidade com a arte, a filosofia pôde ser concebida à maneira de uma “arte da razão”, por sugestão: uma prática que integra – ou tensiona – elementos conceituais com a liberdade e a flexibilidade proporcionadas pela força da metáfora própria da atividade artística.

    As relações entre filosofia, religião e arte foram concebidas como dinâmicas, sujeitas a transformações no curso da história. A filosofia ocidental nasceu na Grécia antiga em substituição às respostas mitológicas e ela própria pode ser substituída. Aqui pode ser notado que, com o gradual, mas constante desenvolvimento científico, também a filosofia tem perdido aos poucos seus elos com a religião e com a arte, sobretudo ao ceder à ciência parcelas que outrora lhe eram constitutivas.

     O caráter dinâmico da relação entre filosofia e ciência me levou a supor que a filosofia possa ser concebida, mesmo em seus núcleos historicamente centrais, como um esforço conjectural ou especulativo antecipador da ciência – aquilo que denominei “protociência”. Essa hipótese resulta do fato de que as ciências básicas nasceram de especulações filosóficas. Contudo, a concepção da filosofia como o berçário das ciências tem sido frequentemente pensada como limitadora e empobrecedora de nossa compreensão da atividade filosófica. Tal crítica revela-se pertinente sempre que temos em vista uma concepção estreita, tanto de cunho positivista como reducionista, do que possa ser entendido como ciência ou mesmo como filosofia.

   O conceito de ciência adotado neste texto é suficientemente liberal e flexível para evitar as dificuldades recém-mencionadas. A ideia central pode ser encontrada em John Ziman, um físico que investigou o funcionamento social da ciência e a definiu como conhecimento público passível de consenso.

   Desenvolvendo a linha proposta por Ziman, defendi que a concepção mais intuitiva e plausível da natureza da ciência é aquela que a entende como toda investigação orientada à obtenção de verdades susceptíveis de legitimação consensual por uma comunidade crítica de ideias. Essa comunidade é entendida como capaz de satisfazer suficientemente exigências de competência, veracidade, transparência e liberdade – condições que só se manifestam quando encontramos objetividade suficiente para possibilitar consenso. Somente sob a observância desses pressupostos a ciência se torna apta a produzir acordos consensuais legítimos acerca da verdade ou falsidade de seus resultados.

     Diante de uma concepção tão liberal e flexível de ciência, torna-se natural reconhecer a possibilidade de que grande parte da filosofia revele um caráter antecipador daquela. A filosofia configura-se, assim, como uma indagação voltada para a verdade que, embora desenvolvida sob a pressuposição de uma comunidade crítica de ideias – aqui entendida como expressão de uma tradição de pensamento com um lastro crítico cumulativo, – não se demonstrou em seu tempo capaz de alcançar sequer a possibilidade de obter acordos consensuais legítimos sobre a verdade ou a falsidade dos seus resultados.

    A assimetria entre filosofia e ciência, nesse contexto, é evidente, embora tenda, progressivamente, a se dissipar, sobretudo quando reconhecemos que as ciências básicas foram, em alguma medida, antecipadas pela filosofia.

     Uma consequência importante de aceitarmos a concepção de filosofia como conjectura que, no que possui de verdadeiro, é antecipadora de um conhecimento passível de legitimação consensual, foi a relativização – e não a simples refutação – da ideia de que a filosofia consiste em uma simples atividade de análise conceitual. Essa ideia, quando bem examinada, remonta às indagações socráticas do tipo “O que é X?”, nas quais X representa um termo conceitual.

     No século passado, a chamada filosofia analítica – entendida como análise linguístico-conceitual – passou a se desenvolver a partir de avanços semióticos surgidos no final do século XIX, sobretudo pela obra de Gottlob Frege. Esses avanços incluíam o uso da lógica dos predicados aplicada à análise da “gramática profunda” de nossa linguagem natural, além da ênfase propedêutica visível na chamada “ascensão semântica”, concebida como instrumento na prevenção de confusões conceituais. Entretanto, essa abordagem precisa manter coerência não apenas com nosso senso comum mais modesto (‘mooreano’ no dizer de D. M. Armstrong), mas também com a imagem científica contemporânea do mundo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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